30 de agosto de 2009

A Distribuição de Bernoulli

Por Tâmata Tarcila Sousa
Estudante de Graduação em Medicina da UFPB (IV Período), Monitora do Módulo Pesquisa Aplicada à Medicina
A Distribuição de Bernoulli geralmente não é conhecida por esse termo, sendo, por isso, um pouco “esquecido” pelos estudantes, já que esta é o “princípio” da Distribuição Binomial.
A Distribuição de Bernoulli é determinada por ensaios independentes repetidos com possibilidade de dois resultados cada ensaio e com probabilidades constantes durante toda a realização de ensaios, ou seja, cada ensaio possui duas possibilidades, uma de sucesso (p) e outra de fracasso(q), sendo cada uma dessas com a mesma probabilidade (FELLER, 1976). Dessa forma, a função de densidade de Bernoulli é a função de densidade de uma variável aleatória discreta x que assume valores 0 e 1 como únicos possíveis.(CLARKE, 1979). Exemplo: Arremesso de uma moeda, indicando-se coroa por “0” e cara por “1”. Se a moeda for "honesta", tanto cara quanto coroa terá a probabilidade de 50%. Logo, se denominamos as probabilidades de cada um p e q, teremos: p + q = 1.
Quando temos uma sucessão de eventos, a probabilidade para o resultado é obtido através da multiplicação das probabilidades de cada evento independentemente acontecer; portanto se denominarmos x para o sucesso e y para o fracasso e suas respectivas probabilidades forem p e q, segundo Feller (1976), o resultado será obtido por:
p X p X p X q X p X p X p X q X p X p X q X q X p X q ....
Dessa demonstração é que deriva a distribuição binomial, onde temos n eventos sucessivos com possibilidade de sucesso ou fracasso e com probabilidades constantes, não importando a ordem na qual os eventos acontecem (PETERS; SUMMERS, 1978). Na distribuição binomial teremos n eventos onde k é o número de sucesso e n - k é o número de fracasso. Dessa maneira, podemos observar a grande importância da Distribuição de Bernoulli para a probabilidade e para a estatística; pois através dela podemos estudar a distribuição binomial que é a base para a Teoria da Probabilidade. Referências CLARKE, A. B.; DISNEY, R. L. Probabilidades e Processos Estocásticos. Livros Técnicos e Científicos Editora S.A. Rio de Janeiro, 1979. FELLER, W. Introdução à Teoria das Probabilidades e Suas Aplicações – Parte 1- Espaço Amostrais Discretos. 3ª Ed. Editora Edgard Blücher LTDA. São Paulo, 1976. PETERS, W. S. ; SUMMERS, G. W. Análise Estatística e Processo Decisório. 2ª Ed. Fundação Getulio Vargas, Instituto de Documentação. Rio de Janeiro, 1978.
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Constipação intestinal funcional

Por Joyce Freire Gonçalves de Melo Estudante de Medicina da UFPB (V Período); Monitora do Módulo de Semiologia Médica
Tomando por base o relato de pacientes a queixa de constipação intestinal figura como a segunda mais frequente (2). É um sintoma mais comum em mulheres e idosos (4). A constipação intestinal é classificada de acordo com sua etiologia em funcional e orgânica1. Esta última é secundária a uma moléstia orgânica, como por exemplo, neoplasia de cólon, distúrbios endorinometábolicos, doenças neurológicas. Sendo, pois, o diagnóstico de constipação intestinal funcional ou essencial reservado aos casos em que os métodos de investigação não tenham detectado nenhum distúrbio orgânico que pudesse desencadear obstipação no paciente (2). O tipo funcional destaca-se por sua maior prevalência em nosso meio (1, 5). Associa-se tal distúrbio a hábitos alimentares irregulares, baixa ingestão de fibras, sedentarismo, perda da eficácia do reflexo de evacuação - ocorre em decorrência da inibição repetida desse reflexo -, além de outros fatores comportamentais e alimentares provenientes da ocidentalização e industrialização (1). A constipação intestinal essencial é definida segundo os critérios do Comitê Internacional Roma II. De acordo com tal documento, para que se faça o diagnóstico de tal distúrbio é necessário que o indivíduo apresente no mínimo por 12 semanas, não necessariamente consecutivas, durante o último ano, dois ou mais dos seguintes sintomas: esforço excessivo para evacuar em mais de 25% das vezes; fezes de consistência endurecida ou sensação de esvaziamento incompleto ou de obstrução em mais de 25% das evacuações; necessidade da realização de manobras manuais a fim de facilitar a evacuação em mais de 25% das defecações e/ou menos de três evacuações por semana. Além disso, afirma que é preciso que também haja ausência de fezes amolecidas e insuficiência de critérios para o diagnóstico de cólon irritável (DROSSMAN et al., 1999 apud CUNHA et al., 2008) (3). Como se pode constatar, o diagnóstico da constipação intestinal funcional é baseado nos sintomas referenciados pelo paciente, sendo, pois, a anamnese o pilar fundamental para a construção do diagnóstico. É importante que conheçamos o modo de instalação e progressão do quadro de constipação, o hábito dietético do paciente, se houve alteração no hábito intestinal, freqüência das evacuações, a consistência das fezes, sensação de esvaziamento incompleto ou obstrução, enfim, todos os fatores que possam estar envolvidos ou venham a corroborar com o diagnóstico de constipação (1, 2, 4).
Outro ponto importante que merece ser investigado é a história familiar do paciente, devendo-se averiguar doenças de caráter hereditário ou familiar que possam desencadear tal sintoma. Ainda nesse contexto, devem ser sempre pesquisados os chamados “sinais de alerta” que apontam para uma etiologia orgânica, dentre os quais se destacam o sangramento por via retal e a ocorrência de dor abdominal ou anal relacionada à evacuação (2). O exame físico deve ser dirigido à exclusão de doenças que possam estar relacionadas à obstipação. Deve-se analisar especialmente o abdome, períneo, reto e ânus. O abdome deve ser inspecionado, a fim de designarmos se a obstrução é total ou localizada, deve-se também pesquisar a presença de cicatrizes, visto que cirurgias prévias podem resultar num quadro obstrutivo; na ausculta, podemos sugerir se há obstrução ou íleo paralítico; à palpação, devem ser pesquisadas a presença de massas, visceromegalias e a sensibilidade dolorosa; por fim, a percussão será útil na diferenciação de uma distensão por gases de uma por líquido ascítico.
No exame do períneo, deverão ser pesquisadas lesões que sejam causa ou conseqüência da constipação. Já no exame do reto, o objetivo é pesquisar a presença de fezes e sua consistência, sendo também investigadas alterações esfincterianas. Também deve ser feito a análise da região anal a fim de identificar possíveis irregularidades (2). Os exames complementares são utilizados também na intenção de exclusão de doença orgânica. Inicialmente, devem ser solicitados exames a fim de excluir endocrinopatias e, em áreas endêmicas, a sorologia para Chagas deve ser solicitada. É recomendado realizar uma colonoscopia ou, ao menos, uma retossigmoidoscopia, em todos os portadores de constipação crônica, a fim de afastar lesão endoluminal (2). Fica evidente, portanto, a importância da história clínica na construção da suspeita diagnóstica de constipação funcional, uma vez que tal distúrbio constitui uma condição clínica definida por seus sintomas. Restando ao exame físico e aos exames complementares o papel de assegurar o diagnóstico, afastando, para isso, possíveis causas orgânicas.
Referências 1. AMBROGINI JÚNIOR O, MISZPUTEN SI. Constipação Intestinal Crônica. Rev Bras Med 2002; 59:133-39. Disponível em http://www.cibersaude.com.br/revistas.asp?fase=r003&id_materia=1079. Acessado em 26/08/09. 2. MAGALHÃES M. F.; LACERDA-FILHO, A. Constipação Intestinal. In: Castro LP, Coelho LGV. (Org.). Gastroenterologia. Rio de Janeiro: Medsi, 2002, v. 1, p. 159-172. 3. CUNHA, G. H. ; MORAES, M. E. ; OLIVEIRA, J. C. Condutas terapêuticas no manejo da constipação crônica. Revista eletrônica pesquisa médica (UFC. Online), v. 2, p. 11-17, 2008. Disponível em http://www.fisfar.ufc.br/pesmed/index.php/repm/article/view/212/201. Acessado em 26/08/09. 4. DANTAS R. Diarréia e constipação intestinal. Medicina, Ribeirão Preto 2004;37, 262-266. Disponível em: http://www.fmrp.usp.br/revista/2004/vol37n3e4/8diarreia_constipacao_intestinal.pdf. Acesso em 26/08/09. 5. LOPES, Adriana Cruz; VICTORIA, Carlos Roberto. Ingestão de fibra alimentar e tempo de trânsito colônico em pacientes com constipação funcional. Arq. Gastroenterol. [online]. 2008, vol.45, n.1, pp. 58-63. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0004-28032008000100011&script=sci_abstract&tlng=pt. Acesso em 26/08/09.

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29 de agosto de 2009

Aprendizado Científico do Estudante de Medicina

O aprendizado científico é uma prática de habilidades manuais, perceptivas e cognitivas de forma dirigida (TESSER, 2008).


Ao chegar à Universidade, o estudante precisa conscientizar-se de que, desse momento em diante, o resultado do processo ensino/aprendizagem no qual passará a se envolver, dependerá fundamentalmente dele mesmo.


Seja pelo seu próprio desenvolvimento psíquico e intelectual, seja pela própria natureza do processo educacional desse nível, as condições de aprendizagem transformam-se no sentido de exigir do estudante maior autonomia na sua efetivação, maior independência em relação aos subsídios da estrutura do ensino e dos recursos institucionais que são oferecidos (LIMA, 2008; LAUFER, 2007).

Por outro lado, o ritmo acelerado das mudanças no campo da Saúde exige que o médico seja um aprendiz ao longo de toda sua vida, sendo capaz de manter seu conhecimento atualizado dentro das disciplinas por ele escolhidas.

O estudante de Medicina precisa exercitar o espírito analítico e, para isso, deve ter praticado a análise de um trabalho científico como aprendizado durante a graduação. Este exercício de crítica de pesquisas científicas constitui verdadeira ferramenta didática, pois o médico terá de aprender e manter-se atualizado com as melhores evidências durante toda sua vida profissional.



É necessário, então, que o estudante adquira o hábito de realizar uma leitura crítica da literatura científica para que possam julgar a validade dos trabalhos publicados.


Na graduação, o ensino pretende desenvolver nos alunos o pensamento científico, reflexivo e crítico. Desta forma, pretende-se que o estudo dos problemas da realidade de forma científica, além da motivação intrínseca dos alunos, seja o instrumento mais apropriado para promover a aprendizagem do conhecimento científico.

O aluno pode, assim, observar, analisar, criticar e buscar informações sobre os problemas da realidade, a fim de escolher alternativas, apresentar e executar soluções fundamentadas na análise (CASSIANI; RODRIGUES, 1998).



Não basta ao aluno de Medicina entender as informações expressas em índices estatísticos. É preciso analisar e relacionar criticamente os dados apresentados, questionando/ponderando até mesmo sua veracidade. Assim como não é suficiente ao aluno desenvolver a capacidade de organizar e representar uma coleção de dados, faz-se necessário interpretar e comparar esses dados para tirar conclusões.


Paradoxalmente, o ensino da aptidão de pensamento crítico ainda é raro nos cursos de graduações na área da Saúde diante da profusão de publicações científicas. Apesar de os estudantes se prepararem para certo domínio científico, eles mostram dificuldade em criticar estudos científicos.


Considerando-se o papel formativo que a pesquisa e o método científico têm sobre a educação do médico, conclui-se que uma parcela significativa dos médicos brasileiros é formada à margem desse sistema, não estando preparada para acompanhar e absorver as inovações no setor de saúde, que são altamente vinculadas ao desenvolvimento científico (MORENO; ARELLANO, 2005). De acordo com Zago (2004), apenas 10%-20% dos cerca de 10.000 médicos formados anualmente no Brasil têm contato com o sistema de pesquisa médica.


Engajar os alunos em trabalhos de investigação pode ser uma das alternativas empregadas para garantir a consolidação da aprendizagem iniciada nos cursos de metodologia científica. Entretanto, além do ensino da metodologia científica no currículo de graduação, há a necessidade de outras atividades científicas, a fim de incorporar a atividade de pesquisa no ensino como a inclusão de revisão de literatura ou artigos científicos nas disciplinas.

No entanto, considera-se que tais aspectos podem ser mais bem sucedidos se a disciplina Metodologia da Pesquisa da graduação for ministrada nos primeiros semestres do curso de graduação, e estimulasse os alunos para a importância da pesquisa (CASSIANI; RODRIGUES, 1998).



Admite-se que o aprendizado prático de análise crítica dota o sujeito do instrumental necessário para a utilização e aplicação do sistema de conhecimentos das atividades que permitam investigar a realidade, desvelar, descrever, conjecturar e diagnosticar.

Nesse sentido, formar o espírito científico requer criar condições favoráveis desde o ingresso do aluno na universidade até o último ano no curso, garantindo um terreno fértil para que as sementes deem frutos, ou seja, instigar e promover o desenvolvimento das habilidades e competências investigativas em temas transversais e específicos relevantes.


Referências

BURIHAN, E. A importância da publicação científica. J Vasc Br 1 (1): 5, 2002.
CASSIANI, S. H. B.; RODRIGUES, L. P. O ensino da metodologia científica em oito escolas de enfermagem da Região Sudeste. Rev. Latino-Am. Enfermagem 6 (2): 73-81, 1998.
MORENO, F.; ARELLANO, M. Publicação científica em arquivos de acesso aberto. Arquivística.net Rio de Janeiro, 1 (1): 76-86, 2005
LAUFER, M. A cultura da publicação científica (I). INCI, 32 (8): 503-503, 2007.
LIMA, R. A educação no Brasil: o pensamento e atuação de José Mário Pires Azanha. 2005. 296 f. Tese (Doutorado em Educação), Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005.

TESSER, C D. Contribuições das epistemologias de Kuhn e Fleck para a reforma do ensino médico. Rev. bras. educ. Med. 32 (1): 98-104, 2008.
ZAGO, M. C A pesquisa clínica no Brasil. Cienc Saúde Coletiva. 9 (22008): 363-374, 2004.



Crédito da imagem: A figura desta postagem foi retirada de guradian.co.uk

28 de agosto de 2009

Síndrome do Intestino Irritável

Por Raissa Dantas de Sá Estudante de Graduação em Medicina da UFPB (IX Período), Extensionista do Projeto continuum (PROBEX/UFPB)
A síndrome do intestino irritável (SII) é um transtorno de origem desconhecida, que não possui evidências de lesão tecidual. Há uma combinação de sintomas gastrintestinais crônicos ou recorrentes, não explicados por anormalidades estruturais ou bioquímicas, a qual é atribuída ao intestino e associada a sintomas de dor e distúrbio da defecação e/ou sintomas de desconforto e distensão abdominal (HELFENSTEIN et al., 2006).
Apesar de sua origem ser desconhecida, a SII é considerada como um distúrbio funcional, devido à ausência de uma lesão identificável. Múltiplos fatores, como genética motilidade intestinal, hipersensibilidade visceral, fatores psicossociais e fatores imunomediados, são cogitados para explicar o complexo sintomatológico da SII. Até a presente data a existência de um "gene da SII” não foi definido, e há necessidade de mais estudos nesse campo (MATHEW; BHATIA, 2009). Sintomas compatíveis com a SII são frequentes em todo o mundo. Estima-se uma prevalência entre 2,1% e 22%, dependendo do critério utilizado (REY; TALLEY, 2009). As mulheres são mais frequentemente afetadas que os homens, mas os motivos permanecem obscuros. A SII ocorre em todas as faixas etárias, mas parece haver um declínio da prevalência com o avançar da idade, novamente por razões desconhecidas. A incidência da SII por ano foi estimada em aproximadamente 1,5% em indivíduos na comunidade; anualmente apenas 0,2% da população receberão diagnóstico de SII (op cit).
Existem dados que permitem considerar como possíveis causas as alterações de natureza psicoemocional e as anormalidades resultantes de infecções prévias. (LOPES, 2006). Cerca de 50% dos pacientes relatam a ocorrência de um evento emocional estressante pouco tempo antes da eclosão dos primeiros sintomas característicos da síndrome. Admite-se que traumas emocionais nas fases iniciais da vida possam culminar no desenvolvimento da síndrome em fases posteriores. A obtenção, na infância, de gratificação afetiva (atenção, recompensas,prêmios, vantagens especiais) dos pais ou de outros membros da família, vigência de doenças, perdas afetivas ou materiais, ou diante de situações estressantes, pode contribuir para o desenvolvimento de um “comportamento doente”.
Evidências recentes sugerem que infecções gastrointestinais agudas podem alterar a função imune do intestino,sensibilizar receptores aferentes e, consequentemente, induzir anormalidades sensoriais ou motoras que poderiam estar relacionadas à origem dos sintomas da SII ( LOPES, 2006).
Quanto à fisiopatologia, os mecanismos julgados de maior importância são as alterações da motilidade intestinal,ca hipersensibilidade visceral, anormalidades psicoemocionais e os desencadeados pela presença de certas substâncias no lúmen do tubo digestivo (Op Cit).
A dor abdominal é o sintoma mais característico, geralmente do tipo cólica, intermitente e mais localizada na porção inferior do abdome, principalmente na fossa ilíaca esquerda. Pode se apresentar com ou sem irradiação para o dorso. Costuma aliviar com a evacuação e piorar com estresse ou nas primeiras horas após as refeições e, dificilmente, faz com que o paciente acorde à noite. (DAMIÃO; MORAES-FILHO, 2001) Constipação alternada com períodos de diarréia é a alteração mais comum nos pacientes com SII, com predomínio de uma ou de outra de acordo com cada paciente. O quadro inicia-se geralmente na adolescência ou juventude e adquire um caráter mais ou menos estável para cada paciente.
Quando houver predomínio de constipação intestinal, os pacientes evacuam menos de três vezes/semana, o que faz com que eles tendam a usar laxantes em quantidades cada vez maiores, agravando ainda mais o quadro. As fezes são endurecidas, fragmentadas (fezes em “cíbalos” ou “caprinas”), e eliminadas com grande dificuldade ("evacuações laboriosas"), com dor anal, e aparecem fissuras e hemorróidas que podem gerar sangramento. Às vezes, o calibre das fezes está diminuído (fezes em “fita”) em virtude do espasmo colônico e retal. Dor abdominal acompanha a gravidade da obstipação e tende a aliviar com eliminação de fezes, porém é freqüente a queixa de uma sensação de evacuação incompleta, o que obriga o paciente a tentar evacuar repetidas vezes (Op Cit).
A diarréia caracteriza-se por ser acompanhada, em geral, de tenesmo e dor abdominal e ocorrer após alimentação; Apresentam mais de três evacuações/dia, fezes líquidas e/ou pastosas e necessidade urgente de defecar. As evacuações não costumam ocorrer à noite, durante o sono, ao contrário das diarréias de causa orgânica. Não há sangue nas fezes (com exceção dos casos de fissura ou hemorróidas), mas pode haver muco.
A maioria das pessoas com SII comenta sobre distensão abdominal, eructações e flatulência freqüentes e abundantes. São sintomas inespecíficos e são atribuídos ao excesso de gás intestinal. Entretanto, estudos quantitativos do volume gasoso intestinal em pacientes com SII revelam que a maior parte deles tem volumes normais de gás. Porém, mínimas distensões intestinais provocadas geram esses sintomas, sugerindo uma diminuição (congênita ou adquirida) do limiar de tolerância à distensão.
Outros sintomas podem ocorrer: pirose, náuseas, vômitos, plenitude pós-prandial, saciedade precoce são relatados por até 50% das pessoas com
SII. Ainda estar presentes manifestações somáticas extradigestivas: palpitações,dor lombar, fibromialgia, cefaléia, fadiga, tremores. As mulheres podem apresentar alterações genitourinárias, tais como dispareunia, diminuição da libido, disúria, polaciúria e sensação de esvaziamento incompleto da bexiga (HELFENSTEIN et al., 2006; LOPES, 2006). Recentemente, numa reunião internacional em Roma, estabeleceu-se um consenso para o diagnóstico da SII, conhecido como Critérios de Roma II. São eles: 1. Presença em pelo menos 12 semanas (não necessariamente consecutivas), durante os últimos 12 meses, de desconforto ou dor abdominal com duas de três características: a. alívio com a defecação; b. início associado à alteração na freqüência das evacuações (mais de três vezes/dia ou menos de três vezes/semana); c. início associado à alteração na forma (aparência) das fezes (fezes endurecidas, fragmentadas, em “cíbalos” ou “caprinas” e fezes pastosas e/ou líquidas). 2. Vários sinais e sintomas foram apontados como elementos de reforço ao diagnóstico da SII: a. esforço excessivo durante a defecação; b. urgência para defecar; c. sensação de evacuação incompleta; d. eliminação de muco durante a evacuação; e. sensação de plenitude ou distensão abdominal. Referências DAMIÃO, A . O.; MORAES-FILHO, J. P. Diagnóstico e tratamento da Síndrome do intestino Irritável. Psiquiatria na prática médica. UNIFESP/EPM, vol34, nº2, junho 2001.Disponível em: unifesp.br/dpsiq/polbr/ppm/atu2_06.htm> Acesso em: 25 ago 2009. HELFENSTEIN, M. HEYMANN, D. F.; FELDMAN, D. Prevalência da Síndrome do Cólon Irritável em Pacientes com Fibromialgia. Rev Bras Reumatol, v. 46, n. 1, p. 16-23, jan/fev, 2006 LOPES, A.C. Tratado de Clínica Médica, vol I, São Paulo: Editora Roca, 2006, p. 1154-1159. MATHEW, P.; BHATIA, S. J. Pathogenesis and management of irritable bowel syndrome. Trop Gastroenterol, 30(1):19-25, 2009 REY, E.; TALLEY, N. J. [Epub ahead of print] Irritable bowel syndrome: Novel views on the epidemiology and potential risk factors. Dig Liver Dis, ago 2009 [apud ahead of print]

Crédito da imagem: http://www.medicinageriatrica.com.br/tag/sindrome-do-intestino-irritavel/

Síndrome de Burnout

Por Raissa Dantas de Sá
Estudante de Graduação em Medicina (IX Período), Extensionista do Projeto Continuum (PROBEX/UFPB)

O impacto do estresse sobre vários profissionais que têm condições de trabalho específicas, com grau elevado de relação com o público, tem sido estudado em outros países sob a denominação de Síndrome de Burned Out, ou Burnout. Alternativamente, emprega-se no Brasil a expressão "Síndrome do Esgotamento Profissional".
O termo burnout (do inglês "combustão completa") descreve principalmente a sensação de exaustão da pessoa acometida. Burnout seria, portanto, uma síndrome de exaustão emocional e de atitudes negativas dos profissionais em relação aos sentimentos dos indivíduos para os quais dirigem o seu trabalho, visto que os seus recursos emocionais estão esgotados.
Trata-se de um distúrbio psíquico de caráter depressivo, precedido de esgotamento físico e mental intenso, intimamente ligado à vida profissional. Os profissionais mais atingidos são aqueles que atuam no atendimento, cuidado e assistência a outras pessoas. Dentre eles destacam-se os que trabalham com segurança, os controladores de vôo, professores, jornalistas, médicos e enfermeiros. Essa síndrome é desencadeada por diversos fatores: estresse no trabalho, pressões diárias, acúmulo de serviços, longas jornadas de trabalho, falta de reconhecimento profissional, alta exposição dos profissionais aos mais diversos riscos, contato constante com o sofrimento, com a dor e até mesmo a morte, convivência com pessoas muito diferentes, difíceis decisões a serem tomadas, entre outros. Este cenário competitivo e até "selvagem" da vida moderna, cujo excesso de trabalho e estresse prolongado são considerados cotidianos, contribuiu para o surgimento da Síndrome de Burnout. Burnout é um "estado de estresse cronificado", constituído por três dimensões: Exaustão Emocional, Despersonalização e Baixa Realização Profissional (MASLACH; LEITER, 1999).
A "Exaustão Emocional" caracteriza-se pela falta de energia, entusiasmo e por sentimento de esgotamento. "Os trabalhadores acreditam que já não têm condições de despender mais energia para o atendimento de seu cliente ou demais pessoas como faziam antes."
A "Despersonalização" faz com que o profissional passe a tratar os clientes, colegas e a organização como objetos, de maneira a desenvolver um quadro de "insensibilidade emocional".

Já a "Baixa Realização Profissional" revela-se por uma tendência do trabalhador em se auto-avaliar de forma negativa. As pessoas sentem-se infelizes com elas próprias e insatisfeitas com seu desempenho profissional. São comuns o sentimento de vazio, fracasso, impotência e baixa autoestima.
Segundo Ballone (2005), além da tríade citada acima, o portador de Burnout também poderá apresentar: 1. Sintomas físicos de estresse, tais como cansaço e mal estar geral. 2. Manifestações físicas: transtornos Psicossomáticos (fadiga crônica, cefaléia, insônia, úlcera péptica, hipertensão arterial, taquiarritmias, perda de peso, mialgias). 3. Manifestações comportamentais: probabilidade de condutas aditivas e/ou evitativas, consumo excessivo de café, álcool, fármacos e drogas ilícitas, absenteísmo, baixo rendimento pessoal, distanciamento afetivo dos clientes e companheiros, atitude "cínica", impaciência e irritabilidade, inquietude, desorientação, incapacidade de concentração, sentimentos depressivos, frequentes conflitos interpessoais no ambiente de trabalho e dentro da própria família. 

Referências 
ROSA, C.; CARLOTTO,M.S. Síndrome de Burnout e satisfação no trabalho em profissionais de uma instituição hospitalar. Revista Sociedade Brasileira de Psicologia Hospitalar, 2005 
MASLACH, C.; LEITER, M.P. Trabalho: Fonte de prazer ou desgaste? Guia para vencer o estresse na empresa (M.S. Martins, Trad.). Campinas: Papirus,1999 
BALLONE, G. J. Síndrome de Burnout - PsiqWeb 2005, Disponível em: psiqweb.med.br, Acesso em: 27 ago 2009. 
SARRIERA, J. C. A Síndrome do Burnout : A Saúde em Docentes de Escolas Particulares; PUCRS,2000 KRAFT, U. Esgotamento Total. Revista Viver: Mente e Cérebro, edição 161, junho de 2006 Disponível em uol.com.br/vivermente/reportagens/esgotamento_total.html

Crédito da imagem: a foto desta postagem foi retirada de nursinglink.com/careers/articles/6239-battling-burnout-in-nursing

26 de agosto de 2009

A outra: Síndrome de Pourfour du Petit

Por George Caldas Dantas
Estudante de Graduação em Medicina da UFPB (X Período), Bolsista do PIBIC/CNPq/UFPB.
A Síndrome de Pourfour du Petit é conhecida por ser o oposto da Síndrome de Claude Bernard Horner. Esta última consiste na presença de midríase, enoftalmia e aumento da fenda palpebral, causada por uma A interrupção em qualquer lugar ao longo deste caminho pré-ganglionar (primeiro ou segundo neurônios antes da sinápse no ganglio cervical superior) ou pós-ganglionar (após ter saído do gânglio cervical superior)- hiperatividade da cadeia simpática cervical, secundária a um processo irritativo. [Ver correção abaixo] O nervo simpático responsável pelo suprimento nervoso ocular e facial segue um trajeto descendente desde o hipotálamo, através do primeiro neurônio motor, até o tronco do encéfalo, seguindo depois até o gânglio estrelado através do segundo neurônio motor (WESTHPAL et al., 2006). Esse complexo trajeto da via simpática faz com que existam distintos níveis de vulnerabilidade da cadeia, que pode provocar alteração do estímulo nervoso, responsabilizando-se pela Síndrome de Horner (SH) ou pela Síndrome de Pourfour du Petit (SPP). A SH é condição clínica bastante conhecida, causada pelo envolvimento da cadeia simpática cervical. É ocasionada mais frequentemente como resultado de um dano ou do envolvimento do gânglio estrelado, por doenças malignas intratorácicas, particularmente o tumor de Pancoast, tumor maligno localizado no ápice pulmonar. É provocada pela interrupção do estímulo nervoso simpático, em qualquer parte da via, apresentando-se clinicamente por miose, ptose palpebral, enoftalmia do olho envolvido e anidrose hemifacial ipsilateral. A SPP é o inverso de SH, sendo de rara observação. Contrariamente à SH, é causada por uma estimulação da cadeia simpática cervical ipsilateral. A etiologia da SPP é semelhante à da SH e pode preceder esta. Pacientes frequentemente apresentam uma história de trauma antes de surgir o quadro. Porém, a literatura mostra também casos secundários a condrossarcoma de costela, carcinoma de esôfago com extensão mediastinal e pelural, carcinoma de mediastino e outros (KARA et al., 2004). Essas possíveis causas provocam uma irritação do cadeia simpática cervical, ocorrendo uma hiperestimulação e consequentemente os sintomas. Pacientes com SPP normalmente apresentam achados oculares que são opostos à SH, como exoftalmia, retração palpebral e midríase, com as reações pupilares mantidas. O paciente carrega o risco de desenvolver conjuntivite e ceratite em casos de uma maior exoftalmia. Casos relatados na literatura associam também uma hiperhidrose ipsilateral de membro superior e hemiface. A síndrome recebe este nome em memória de François Pourfour du Petit (1664-1741), um médico-cirurgião das tropas de Luis XIV. Pourfour, mediante observação dos soldados com ferida a espada da cadeia simpática cervical, sua exploração cirúrgica e posterior reprodução experimental em animais, descobriu que a secção do nervo intercostal, da cadeia simpática cervical, era seguida de ptose palpebral, miose e enoftalmia, e que a estimulação dessas estruturas causava o inverso, midríase e retração palpebral. A maioria dos casos de síndrome Pourfour du Petit encontrados na literatura são apresentados muito brevemente no contexto de outras doenças, sem as características clínicas muito detalhadas. A maioria desses casos são relatados em artigos antigos, por vezes com diagnóstico incerto. Nesse sentido, citando Ortiz de Zárate, Ioli (2002) menciona que Pourfour du Petit publicou em 1727 os resultados desses experimentos, porém o referido autor comenta que "Es el único fundamento de la existência del síndrome de Pourfour du Petit, interpretándolo como irritación del simpático" [...] "...surge la impresión de que el síndrome es conocido por "todos porque figura en los textos para estudiantes, pero nadie lo ha visto nunca fehacientemente, y en verdad, quizás no exista". Referências IOLI, P. El Síndrome de Claude Bernard-Horner y otros desconocidos de siempre. Revista del Hospital Privado de Comunidad, 5 (2): 2002 KARA, M. et al. “Unilateral hiperydrosis in Porfour Du Petit syndrome”. Eur J Cardiothorac Surg 26:456-458, 2004. ESPEJO, D. C.E. et al. Síndrome de Porfour du Petit. Neurología. 13 (3): 145-7, 1998.
WESTHPAL, F. L. et al. “Síndrome de Claude Bernard-Horner associada ao empiema pleural”. J Bras Pneumologia 32 (2), 2006.
Crédito da imagem: a figura desta postagem, representando a via pupilar simpática (oculossimpática), foi retirada de http://www.jeffmann.net/NeuroGuidemaps/anisocoria.htm
Correções no texto realizadas em 04/01/2011:
Primeiro parágrafo: Esta última consiste na presença de miose, enoftalmia e redução da fenda palpebral, causada por uma A interrupção em qualquer lugar ao longo do caminho pré-ganglionar ou pós-ganglionar do nervo.
A Síndrome de Porfour Du Petit decorre da hiperatividade da cadeia simpática cervical, secundária a um processo irritativo. Ainda sobre a Síndrome de Claude-Bernard-Horner neste blog:

21 de agosto de 2009

Síndrome da Apnéia Obstrutiva do Sono

Por Antônio Edilton Rolim Filho
Estudante de Graduação em Medicina (VIII Período), Extensionista do Projeto Continuum (PROBEX/UFPB)
A síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS) é caracterizada pela obstrução completa ou parcial recorrente das vias aéreas superiores durante o sono, resultando em períodos de apnéia, dessaturação de oxihemoglobina e despertares freqüentes com consequente sonolência diurna. Os episódios de obstrução e apnéia ocorrem em todos os estágios do sono, especialmente no estágio 2 do sono não-REM e durante o sono REM, quando as apnéias tendem a ser mais longas e a dessaturação arterial mais acentuada. Entre os fatores associados à síndrome da apnéia do sono citam-se a história familiar, obesidade, aumento da circunferência cervical, aumento da relação cintura-quadril, hipotireoidismo, diabetes, acromegalia, insuficiência renal crônica, gravidez e roncos, entre outros. A SAOS é classificada dentre os distúrbios do sono como uma dissonia (alterações que podem produzir insônia ou sonolência excessiva). Para uma correta interpretação e diagnóstico desta entidade, alguns conceitos são fundamentais.
Os eventos respiratórios durante a noite, por definição, devem ter ao menos 10s de duração, e podem ser do tipo: 1) apnéia obstrutiva - evento caracterizado pela completa obstrução das vias aéreas superiores; o fluxo de ar é interrompido a despeito de esforços respiratórios contínuos; 2) apnéia central - evento caracterizado pela ausência completa de esforços respiratórios por alteração do estímulo proveniente do sistema nervoso central; 3) hipopnéia - evento caracterizado como uma redução transitória e incompleta do fluxo de ar em ao menos 50% do fluxo aéreo basal. Pode ser central ou obstrutiva em sua natureza. Apesar de alguns estudos indicarem que a apnéia obstrutiva do sono seja uma doença relativamente comum, é freqüentemente não diagnosticada pelos médicos. O não reconhecimento da apnéia obstrutiva do sono é preocupante, devido as complicações associadas e ao risco de morte súbita nos pacientes com a doença. Suspeita-se de SAOS em um paciente quando sua companheira (o), ou familiar, relata que este ronca e pára de respirar à noite, além da menção de sonolência durante o dia. Este diagnóstico clínico isolado é capaz de detectar a doença em apenas 50-60% dos casos.
A confirmação definitiva da apnéia obstrutiva do sono é feita através do estudo do sono ou polissonografia (95% de sensibilidade). Este exame é uma monitorização do sono do paciente em ambiente calmo e apropriado, sendo monitorizados eletroencefalograma, eletromiograma, eletrocardiograma, concentração de oxigênio no sangue, fluxo de ar, esforço respiratório, frequência cardíaca e a pressão arterial. A polissonografia avalia o número e a duração das apnéias e hipopnéias , classificando a SAOS em três graus: leve, moderado e severo. Os portadores da apnéia obstrutiva do sono apresentam um significativo prejuízo em sua qualidade de vida. Sonolência diurna, fadiga, dor de cabeça e indisposição geral, são queixas comuns nesses pacientes. Nos últimos anos, o interesse no estudo da apnéia obstrutiva do sono tem se voltado para sua identificação como um fator de risco para o surgimento de outras doenças.
A doença que tem sido mais estudada e correlacionada com a apnéia obstrutiva do sono é a hipertensão arterial. Hoje a apnéia obstrutiva do sono é considerada como uma causa curável de hipertensão arterial. Doenças como o infarto do miocárdio, insuficiência cardíaca, arritmias cardíacas, derrame cerebral, acidentes automobilísticos entre outras, têm sido associadas à apnéia obstrutiva do sono, porém sem o mesmo nível de evidência que os estudos com hipertensão arterial. Têm sido descritos casos de morte súbita em portadores da apnéia obstrutiva do sono. O tratamento da apnéia obstrutiva do sono visa melhorar a qualidade de vida do paciente, bem como evitar o aparecimento de complicações associadas à doença. Em portadores de hipertensão arterial, o tratamento da SAOS pode diminuir a pressão arterial ou até mesmo normalizá-la. O risco de um infarto do miocárdio ou acidente vascular encefálico também diminui com o tratamento dessa enfermidade. Referências DRAGER, L.F. et al. Síndrome da Apnéia Obstrutiva do Sono e sua relação com a Hipertensão Arterial Sistêmica: Evidências Atuais. Arquivo Brasileiro de Cardiologia. 2002, vol.78, n.5, pp. 531-536. ZONATO A.I.; FORMIGONI G.G.S. Síndrome da Apnéia Obstrutiva do Sono: Análise da Eficácia do Tratamento Cirúrgico. Arquivos Internacionais de Otorrinolaringologia. n. 3, 1997. CAHALI, M.B.. Conseqüências da síndrome da apnéia obstrutiva do sono. Revista Brasileira de Otorrinolaringologia . Vol.73. n. 3, p. 290-290, 2007.

Síndrome Consumptiva

Por Gabriel Braz Garcia
Estudante de Graduação em Medicina da UFPB (VII Período), Extensionista do Projeto Continuum (PROBEX/UFPB)

A síndrome consumptiva é caracterizada pela perda de peso involuntária maior que 10%. Em geral, está associada a febre maior que 38ºC de mais de 30 dias de duração e diarreia (mais de duas evacuações por dia durante mais de 30 dias). Além disso, pode-se encontrar conjuntamente, a emaciação muscular grave com degeneração dispersa das miofibras com evidências ocasionais de miosite.
Em geral, acompanha-se de aumento da morbidade e da mortalidade e, maior susceptibilidade a infecções oportunistas e tumores. Configura-se como um estado complexo de interação entre anorexia, perda de massa gorda e magra, distúrbios psicológicos e piora acentuada da qualidade de vida; merece, portanto, ser alvo de estudo e acompanhamento médico e investigação da doença de base. Dentre as causas, citam-se as que se desenvolvem pelo metabolismo exagerado como o feocromocitoma e o hipertireoidismo; as envolvidas com perdas anormais de elementos nutritivos, como diabetes mellitus, síndromes de má absorção e fístulas do tubo gastrintointestinal; todavia as doenças de maior destaque e que estão primariamente associadas à anorexia e digestão alimentar reduzida são as neoplasias e a síndrome da imomunodeficiência adquirida (SIDA/Aids). Os casos de síndrome consumptiva em pacientes com Aids têm sido denominados de Wasting Syndrome.
Segundo dados da literatura, em torno de 80% de pacientes com câncer avançado cursam com a "Síndrome Consumptiva Crônica". Em relação a Aids, aponta-se que, nos Estados Unidos, em 10% dos casos é tida como a condição inicial definidora do diagnóstico.
Em se tratando de etiopatogenia, sabe-se que está em função da diminuição da ingesta calórica, aumento do metabolismo e perda de calorias. Este processo, em especial para as neoplasias, envolve a produção de citocinas, liberação de fatores proteolíticos e lipolíticos e alteração no metabolismo intermediário.
Todavia, a caquexia, elemento fundamental dentro da síndrome consumptiva, é tida como um fenômeno complexo, multifatorial. Pode estar relacionada a fatores mecânicos, como obstruções ao trato gastrintestinal, falhas abortivas, intervenções cirúrgicas lesivas ou tratamento químico ou radioterápico, os quais podem induzir náuseas, vômitos, estomatites e diarreia, culminando com a perda de peso característica. 
Outra condição associada à síndrome consumptiva é a anorexia nervosa, um transtorno do comportamento alimentar que se desenvolve principalmente em adolescentes e mulheres jovens. Caracteriza-se por uma grave restrição da ingestão alimentar, busca incessante pela magreza, distorção da imagem corporal e amenorreia. Embora muitas vezes, a doença não consiga ser revertida, demonstrando um prognóstico sombrio, com baixa sobrevida, o médico deve instituir sempre uma atenção especial ao doente portador dessa síndrome, no intuito de melhorar sua qualidade de vida. O paciente deve ser avaliado como um ser psicologicamente afetado, como resultado das incertezas em relação à sua doença, seu diagnóstico, tratamento e receio quanto ao futuro. 

Referências 
HARRISON, et al. Medicina Interna, 17ª edição. Rio de Janeiro: McGraw-Hill Interamericana do Brasil, 2008. 
AKIO, I. Câncer Anorexia-Cachexia Syndrome. CA câncer J Clin 52: 72-91, 2002.
COODLEY, G.O.; LOVELESS, M.O.; MERRIL, T.M. The HIV wasting syndrome: a review. J Acquir Immune Defic Syndr. 7(7):681-94, 1994. 
CORDAS, T. A.; CLAUDINO, A. M. Eating disorders: historical background. Rev. Bras. Psiquiatr. vol.24, suppl.3, pp. 03-06, 2002.


Crédito da imagem: foto capturada em http://www.sheilacasey.com

19 de agosto de 2009

Relatório do Seminário I de MCO2 em 2009.1

O Seminário I de 2009.1, que deveria ter sido realizado em 13/07/09, foi transferido para 13/08/09. O artigo sob análise intitulou-se: "Riscos associados ao processo de desmame entre crianças nascidas em hospital universitário de São Paulo, entre 1998 e 1999: estudo de coorte prospectivo do primeiro ano de vida", cuja referência é a seguinte: Bueno MB et al. Riscos associados ao processo de desmame entre crianças nascidas em hospitais universitários de São Paulo, entre 1998 e 1999: estudo de coorte prospectivo do primeiro ano de vida. Cad Saúde Pública 2003; 19: 1453-60.

Nesse seminário de MCO2 foi feita a leitura crítica pelos alunos de um artigo sobre um estudo de coorte. A leitura crítica de um artigo científico é uma atividade exigente. Requer uma atitude ativa de reflexão e de aquisição prévia de conhecimentos, pois implica dar atenção especial não apenas a aspectos formais mas principalmente aos elementos metodológicos e estruturantes dos artigos científicos, verificando o rigor e consistência da informação.

Dentro dos estudos observacionais, o estudo de coorte é o estudo de eleição para investigar incidências, fatores de risco e as suas consequências, fatores de prognóstico, a história natural da doença e a (s) causa (s) de determinado evento.



Trata-se de um estudo analítico longitudinal no qual um conjunto de pessoas com alguma característica em comum é monitorizado ao longo do tempo. Os investigadores determinam, por observação, no início e ao longo do estudo, os sujeitos que estão ou não expostos a uma determinada característica (normalmente um fator de risco). Os sujeitos, expostos e não expostos, são seguidos ao longo de um período de tempo de forma a observar a (s) consequência (s) dessas características.

Abaixo um resumo do relatório do monitor Gilson da discussão feita a partir da participação dos alunos de MCO2 no seminário com base no referido artigo.


1. Título- Os alunos sugeriram uma ligeira modificação para o título: “Riscos associados ao processo de desmame entre crianças nascidas em hospital universitário de São Paulo entre 1998 e 1999: coorte do primeiro ano de vida”. "Coorte prospectivo" poderia ter sido substituído por apenas "coorte".
2. Resumo- O primeiro objetivo (e principal) apresentado não condiz com o expresso no título e o conteúdo do trabalho. Assim, este deveria ter sido o objetivo: “identificar fatores associados com a duração do aleitamento materno e aleitamento materno exclusivo.”

3. Métodos
- Não ficou claro o modo como foi feita o preenchimento do questionário às mães. No é considerada a possibilidade de analfabetismo da mãe, o que poderia interferir no preenchimento do questionário.
- Não se menciona o software estatístico utilizado para a análise estatística. Embora esse aspecto não seja fundamental, recomenda-se que seja nomeado o programa usado.
- Não ficou claro como foi feita a coleta das informações dadas pela mãe nas entrevistas realizadas ainda quando esta se encontrava no hospital.
- Uma sugestão pertinente dos alunos foi a de que poderia ter sido questionado á mãe quanto tempo ela desejava amamentar e qual a importância que atribuia à amamentação na primeira entrevista.
- Algumas outras variáveis poderiam ser consideradas para relacionar com o desmame precoce: variável número de integrantes na residência; variável mãe que trabalha; variável problema com produção de leite pela mãe.
- Não foi calculado o tamanho da amostra. Contudo, fazendo-se os cálculos verifica-se que a amostra foi satisfatória em termos de número de sujeitos. Utilizando-se-se a fórmula n = z² . p. q / e², onde: z = 1,96 (para confiança de 95%), p = 0,5 / q = 0,5 / e = 0,05 (p = q = 0,5 porque antes da coleta de dados, não se tinha conhecimento ou estimativa de quantas mães deixam o aleitamento exclusivo até os 6 meses pela literatura). Desta forma, teríamos: n = [(1,96)² . 0,50 . 0,50 / (0,05)²] >> n = 384. Portanto, houve número satisfatório de pacientes acompanhados (450). Até mesmo a amostra com seguimento total se mostrou dentro de um limite aceitável (383).
- Os autores deveriam poderiam ter utilizado um critério reconhecido de avaliação do poder aquisitivo. Esta é representada pelo “Critério de Classificação Econômica Brasil”, da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (ABEP).
5. Resultados- Na tabela 1, o título não está completo. Deveria conter o número da amostra, ano e local da pesquisa.
- Na mesma tabela, não houve partos do tipo fórceps. Esse dado deveria ter sido explicado no texto.
- Afirma-se que “o principal motivo dessas perdas foi mudança de endereço (83,7%)”. Mas não se relatam os outros motivos de perdas.
6. Discussão
- Utiliza-se a idade mediana da criança para avaliação da permanência em aleitamento materno. Para esse mesmo fim, ainda se poderia utilizar a amplitude, com o valor máximo e mínimo. Seria também interessante usar a mediana aliada à média.
- Houve associação entre desmame precoce e sexo do bebê, mas os autores mencionaram não haver explicação para o achado. Deveriam ter buscados na literatura trabalhos qualitativos apontando explicações.
- A afirmação “em nenhum momento fatores socioeconômicos e demográficos apresentaram associação com o desmame total” contradiz vários resultados do próprio estudo.
- O estudo aponta para a associação estatística entre o número de consultas de pré-natal, mas na discussão poderia ter sido questionado esse achado, pois a qualidade das informações fornecidas pela equipe de saúde e do próprio atendimento do pré-natal deveriam ter sido mencionadas como mais importantes que o núemro de consultas, como os alunos encontraram um artigo discutido anteriormente nos seminários do módulo.
- Teria sido interessante que os autores sugerissem a realização de estudos posteriores para realizar uma comparação entre o problema do desmame antes e depois das campanhas do Ministério da Saúde "Os 10 passos da Amamentação", uma vez que o estudo em questão foi realizado no início dessa campanha, que ainda não havia sido implementada.


Considerações sobre publicação duplicada

- Encontrou-se uma publicação prévia ou duplicada do mesmo artigo que estava sendo discutido no seminário (BUENO et al., 2002). Uma publicação prévia ou duplicada é a publicação de um artigo que se superpõe substancialmente a outro já publicado. Segundo o Comitê Internacional de Editores de Periódicos Médicos, "os leitores de revistas periódicas merecem ter a confiança de que o artigo está sendo republicado por escolha do autor e do editor". As bases para esta posição são as leis internacionais de direito autoral, a conduta ética e o uso de recursos, obedecendo a uma lógica de custo efetividade. A maioria das revistas não deseja receber artigos com trabalhos que já tenham sido publicados, ou que estejam contidos em outro artigo que tenha sido submetido ou aceito para publicação em outro periódico (COMITÊ INTERNACIONAL DE EDITORES DE PERIÓDICOS MÉDICOS, 1999).

Considerações sobre terminologia durante a discussão
A análise univariada realizada serve de preâmbulo à análise multivariada, utilizada posteriormente. A univariada serve para se estabelecer graus de relação independente entre variável e desfecho. Já a bivariada serve para se estabelecer relações de causalidade entre duas variáveis, com relação ao desfecho. Neste caso, não se realiza uma análise bivariada de início porque se quer determinar a relação de cada variável com o desfecho isoladamente. A relação entre as variáveis será determinada depois, com a análise multivariada, que levará em conta a inter-relação de várias variáveis para se chegar ao desfecho.
Referências
BUENO, M. B. et al. Duração da amamentação após a introdução de outro leite: seguimento de coorte de crianças nascidas em um hospital universitário em São Paulo. Rev. bras. epidemiol. 5 (2): 145-152, 2002.
COMITÊ INTERNACIONAL DE EDITORES DE PERIÓDICOS MÉDICOS. Requisitos uniformes para manuscritos submetidos a periódicos biomédicos. Informe Epidemiológico do SUS, 8 (2): 5-16, 1999.

Após término do relatório desse seminário, considerando a relevância do tema, vale lembrar os 10 PASSOS DO ALEITAMENTO MATERNO (enviados por Roberta Ismael, da turma):
1- Ter uma norma escrita sobre aleitamento materno, que deve ser rotineiramente transmitida a toda a equipe de saúde.
2- Treinar toda a equipe de cuidados de saúde, capacitando-a para implementar essa norma.
3- Informar a todas as gestantes sobre as vantagens e o manejo do aleitamento.
4- Ajudar as mães a iniciar a amamentação na primeira meia hora após o parto.
5- Mostrar às mães como amamentar e como manter a lactação, mesmo se vierem a ser separadas de seus filhos.
6- Não dar a recém-nascidos qualquer outro alimento ou bebida além do leite materno, a não ser quando indicado pelo médico.
7- Praticar o alojamento conjunto, permitir que mãe e bebê permaneçam juntos 24 horas por dia.
8- Encorajar o aleitamento sob livre demanda.
9- Não dar bicos artificiais ou chupetas a crianças amamentadas ao seio.
10- Encorajar a formação de grupos de apoio à amamentação, para onde as mães devem ser encaminhadas logo após a alta do hospital ou ambulatório.

Crédito da imagem: http://www.flickr.com/photos/87384343@N00/2039584909
A foto desta postagem tem fins apenas ilustrativos, não se refere ao artigo que foi comentado.

16 de agosto de 2009

Seminário IV de MCO2 em 2009.1: Abertas inscrições para participação

Seminário IV de 2009.1: 17/08/09 - Artigo para análise - "Lysine clonixinate versus dipyrone (metamizole) for the acute treatment of severe migraine attacks: a single-blind, randomized study "
Referência:
KRYMCHANTOWSKI, Abouch Valenty; CARNEIRO, Henrique; BARBOSA, Jackeline and JEVOUX, Carla. Lysine clonixinate versus dipyrone (metamizole) for the acute treatment of severe migraine attacks: a single-blind, randomized study. Arq. Neuro-Psiquiatr. vol.66, n.2a, pp. 216-220, 2008.
Link:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0004-282X2008000200015

Apresentação:
Estudantes 2008.2 do grupo IV
Moderação:
Profa. Rilva
Secretário:
Monitor Gilson
Grupo de discussão:
Os demais alunos da turma 2008.2 podem se inscrever nesta página para determinar a ordem de participação no seminário.

14 de agosto de 2009

O Teorema do Limite Central

Por Gilson Fernandes Filho
Estudante de Graduação em Medicina da UFPB (III Período) e Monitor do Módulo Pesquisa Aplicada à Medicina (MCO2)
O Teorema do Limite Central é um dos teoremas mais importantes da estatística e probabilidade, constituindo a base para a estatística inferencial com base na distribuição normal.
O Teorema afirma que a soma de muitas variáveis independentes aleatórias e com mesma distribuição de probabilidade sempre tende a uma distribuição normal. Para uma amostra suficientemente grande, a distribuição de probabilidade da média amostral pode ser aproximada por uma distribuição normal, com média e variância iguais às da população. Essa ideologia funciona do seguinte modo: dada uma população, com qualquer tipo de distribuição de variáveis, que possua uma média “μ” e um desvio-padrão “σ”, deve-se tirar várias amostras de tamanho “n” dessa população e analisar a distribuição das médias de cada amostra. Desta forma, o que ocorre é o seguinte: · Inevitavelmente, a distribuição dessas médias amostrais tende a uma distribuição normal, à medida que o tamanho”n” da amostra aumenta. · A média das médias amostrais tenderá à média populacional: · O desvio padrão das médias amostrais é o erro-padrão da média Na prática, sempre que a amostra for maior que 30 (n > 30), essa distribuição de médias amostrais se aproxima de modo satisfatório a uma distribuição normal. É interessante notar que a curva de distribuição da população geral não interfere para obtenção da distribuição normal da amostra. A população pode ter distribuição uniforme, assimétrica ou normal, que sempre ao se realizar a divisão da população em amostras e analisar suas medias, aproximar-se-á de uma distribuição normal. O Teorema do Limite Central está intimamente associado à idéia do Intervalo de Confiança. O Intervalo de Confiança se conceitua como a amplitude, o intervalo de valores que tem determinada probabilidade de conter o valor verdadeiro da população. Assim, com a separação da população em amostras distintas de mesmo tamanho, verifica-se uma distribuição normal das médias. Assim, pode-se verificar aquelas médias que não se adéquam como representativas da população. Aí surge também o conceito de nível de confiança, que se refere à probabilidade do intervalo de confiança conter o valor verdadeiro do parâmetro populacional. Ou seja, por exemplo, a partir de uma população, separamos 100 amostras de mesmo tamanho. A união de todas as médias do parâmetro requerido formará uma curva de distribuição normal.
Se quisermos determinar um intervalo de confiança que possua x% de confiança, isso quer dizer que em x% das 100 amostras o parâmetro fazia parte do intervalo. Ou seja, terá 95% de confiança o intervalo que contém o parâmetro de 95 dessas 100 amostras. Assim, para uma significância de 5%, os parâmetros das 5 amostras que não pertencem a esse intervalo não são representativos da população e o intervalo de confiança se obtém a partir dos valores máximo e mínimo ideais determinados pelo nível de confiança. Portanto, o Teorema se mostra como essencial para a análise estatística, principalmente de populações que não apresentam distribuição normal e com um tamanho suficiente. Referências CANCHO, V, G. Noções de Estatística e Probabilidade. Universidade Federal de Ouro Preto, Departamento de Matemática. Ouro Preto, 2004. P. 109. MEYER, P, L. Probabilidade - Aplicações à Estatística. 2ª Ed. Livros Técnicos e Científicos Editora S.A. Rio de Janeiro, 1983.
Crédito da imagem: A figura desta postagem foi retirada de:

11 de agosto de 2009

A Síndrome de Wernicke-Korsakoff

Por George Caldas Dantas Estudante de Graduação em Medicina da UFPB / Bolsista do Programa de Iniciação Científica PIBIC/UFPB/CNPq
A doença de Wernicke e a psicose de Korsakoff foram identificadas no final do século XIX. A primeira é caracterizada por nistagmo, marcha atáxica, paralisia do olhar conjugado e confusão mental. A psicose de Korsakoff é uma desordem mental. Ambas as desordens estão associadas ao alcoolismo e à deficiência nutricional. Em 1881, Carl Wernicke descreveu pela primeira vez uma patologia de início súbito, caracterizada por paralisia dos movimentos oculares, marcha atáxica e confusão mental. Denominou, então, a doença de "polioenncephalitis hemorrhagica superioris". Em 1852, Magnus Huss fez menção a um distúrbio de memória em alcoolistas, elucidado mais tarde, entre 1887 a 1891, pelo psiquiatra russo S. S. Korsakoff, que ressaltou a relação entre a polineuropatia e a desordem de memória, como sendo "duas faces de uma mesma doença". O postulado de que uma única causa é responsável pela doença de Wernicke e a psicose de Korsakoff foi feito inicialmente por Murawieff em 1897. A Síndrome de Wernicke-Korsakoff (SWK), algumas vezes denominada "beriberi cerebral", é uma síndrome comumente associada à dependência de álcool e, em alguns casos, a alguns tipos de câncer, hiperemese gravídica, obstrução de intestino delgado, anorexia nervosa e gastroplastia. A tríade clássica descrita por Wernicke é composta de oftalmoplegia, ataxia e distúrbio mentais e de consciência. As anormalidades oculares consistem em nistagmo, horizontal ou vertical, paralisia ou paresia dos músculos retos externos e do olhar conjugado, a ataxia é de marcha e postural. Os distúrbios de consciência e de estado mental ocorrem principalmente como um estado confusional global, no qual o paciente está apático, desatento e com mínima expressão verbal espontânea, podendo evoluir para coma. As necessidades diárias de tiamina são estimadas em 1,0 a 1,5 mg/dia em pacientes normais. A tiamina é um importante co-fator da enzima piruvato desidrogenase e alfa-cetoglutarato desidrogenase, envolvida no metabolismo de carboidratos e da transcetolase, uma enzima importante da via das pentoses. A absorção de tiamina é prejudicada pela deficiência nutricional e pelo álcool, dificultando o tratamento de alcoolistas. A situação é freqüentemente agravada pela doença hepática subjacente, que leva à redução dos estoques corporais e à diminuição do metabolismo de tiamina. Vários mecanismos têm sido implicados na patogênese dessa síndrome, mas ainda não são totalmente compreendidos. O diagnóstico clínico da SWK ainda não está sob domínio médico. A doença pode ser subdiagnosticada possivelmente devido aos rígidos critérios tradicionais e às formas subclínicas da encefalopatia de Wernicke. Além disto, a encefalopatia de Wernicke pode ser facilmente subestimada como causa de deterioração do estado mental em pacientes alcoolistas. Para maior eficiência diagnóstica, é fundamental um alto índice de suspeita em "pacientes de risco", particularmente alcoolistas. As avaliações da encefalopatia de Wernicke por tomografia computadorizada e ressonância magnética revelam lesões na porção medial do tálamo e mesencéfalo, dilatação do terceiro ventrículo e atrofia dos corpos mamilares Os pacientes devem ser hospitalizados e o tratamento deve ser imediatamente iniciado com a administração de tiamina, uma vez que esta previne a progressão do doença e reverte as anormalidades cerebrais que não tenham provocado danos estruturais estabelecidos. A despeito do risco de diminuição da absorção intestinal com terapia oral, doses de 50 a 100 mg de tiamina, três a quatro vezes por dia, devem ser instituídas por vários meses. O paciente deve também aderir a uma dieta balanceada. A síndrome de Wernicke-Korsakoff complica o tratamento do alcoolismo. Alcoolistas em declínio cognitivo respondem pobremente à psicoterapia e aos esforços educacionais. Referências ZUBARAN, C. ; FERNANDES, J.; MARTINS, F.; SOUZA, J.; MACHADO, R.; CADORE, M. Aspectos clínicos e neuropatológicos da síndrome de Wernicke-Korsakoff. Rev. Saúde Pública, vol.30, n° 6, 1996. MACLEL, C.; KERR-CORRÊA, F. Complicações psiquiátricas do uso crônico do álcool: síndrome de abstinência e outras doenças psiquiátricas. Rev. Bras. Psiquiatr. 26(Supl I):47-50, 2004.

A Transição Epidemiológica

Por Natália Costa de Andrade Estudante de Graduação em Medicina da UFPB (VIII período), extensionista do Projeto Continuum de extensão - PROBEX/UFPB
O desaparecimentode certas doenças, ou a diminuição da sua frequência, gera um processo de substituição que altera perfis epidemiológicos e humanos. Define-se como transição epidemiológica o processo de mudança na incidência ou na prevalência de doenças, bem como nas principais causas de morte, ao longo do tempo. Esse processo está, em geral, condicionado por dois fatores: a) mudanças associadas à estrutura etária da população, ocorridas ao longo do processo de transição demográfica e propiciadas pela rápida queda da fecundidade em um contexto mais suave de declínio da mortalidade. Portanto, entende-se por transição epidemiológica as mudanças ocorridas no tempo nos padrões de morte, morbidade e invalidez que caracterizam uma população específica e que, em geral, ocorrem em conjunto com outras transformações demográficas, sociais e econômicas.
O processo engloba três mudanças básicas: substituição das doenças transmissíveis por doenças não-transmissíveis e causas externas; deslocamento da carga de morbi-mortalidade dos grupos mais jovens aos grupos mais idosos; e transformação de uma situação em que predomina a mortalidade para outra na qual a morbidade é dominante. O declínio do coeficiente de mortalidade geral , tal como ocorreu anteriormente na Europa ,não é o único aspecto notável no Brasil nos últimos 50 anos. A redução da mortalidade infantil, o aumento da expectativa de vida da população e a modificação do seu perfil epidemiológico foram também observados. Este processo foi descrito como uma transição epidemiológica que caracteriza-se pela evolução progressiva de um perfil de alta mortalidade por doenças infecciosas para um outro onde predominam os óbitos por doenças cardiovasculares, neoplasias, causas externas e outras doenças consideradas crônico-degenerativas. A determinação do perfil epidemiológico da mortalidade deve ser considerada como o resultado de um processo dinâmico, onde as variáveis são interdependentes e podem ter um peso diferenciado, de acordo com o local, com a sociedade e com o tempo histórico. De fato, no Brasil, ambos os mecanismos de mudança do padrão de mortalidade (a adoção de medidas preventivas e o desenvolvimento econômico) ocorrem simultaneamente. No Brasil, a taxa geral de mortalidade decresceu, a expectativa de vida cresceu 20 anos no mesmo período, e a mortalidade infantil decresceu. Em 1930, as doenças infecciosas e parasitárias foram responsáveis por 46% do total de óbitos, enquanto em 1985 elas representavam apenas 7%. Por outro lado, as doenças do aparelho circulatório representavam 12% em 1930 e chegaram a 33% em 1985. Aumentos pronunciados ocorreram com as neoplasias e com as mortes conseqüentes às causas externas: ambas tiveram um aumento proporcional de 3% para 12%. Apesar disso, observa-se que a queda da mortalidade por doenças infecciosas não tem sido acompanhada pela redução de sua morbidade. O Brasil se encontra, portanto, em pleno estágio intermediário de transição epidemiológica, sendo que esta não é uniforme: em alguns estados, ou regiões destes, esta se encontra em fase inicial; em outros, na fase intermediária, e em alguns a transição está quase se completando.Este contraste é observado entre áreas de desenvolvimento diferenciado intra-regionais e entre subgrupos populacionais submetidos a condições de vida também diferenciadas nestas regiões. As doenças infecciosas apresentam maior prevalência nas regiões de precária infra-estrutura e entre as populações mais pobres.
No Brasil, a hipertensão arterial tem alta determinação social.A proporção de trabalhadores de baixa renda em uma população está relacionada com a prevalência da hipertensão arterial. Desta forma, estas doenças não seriam a conseqüência inevitável do processo de envelhecimento da população e sim preveníveis por serem o resultado de modificações do estilo de vida, da relação do ser humano com o ambiente onde vive e do qual faz parte. Assim, as mudanças no modelo de desenvolvimento, no estilo de vida e no comportamento assumem importância para a Saúde Pública. No Brasil, devem se considerar, no processo de transição epidemiológica, componentes sócio-econômicos, culturais, demográficos e ambientais. Referências OMRAM, A. R. The epidemiologic transition: a theory of the epidemiology of population change. Bulletin of the World Health Organization 79(2):161-170, 2001. PRATA, P. R. A Transição Epidemiológica no Brasil. Cad Saúde Pública. 8 (2): 168-175, 1992. SCHRAMM, J. M. A. et al. Transição epidemiológica e o estudo de carga de doença no Brasil. Ciênc. saúde coletiva9(4):897-908, 2004.
Crédito da imagem: A ilustração desta postagem foi retirada de http://amro.who.int/English/DPI/Number14_article1_2.htm

10 de agosto de 2009

Relatório do V Seminário de MCO2 em 2009.1


O seminário de hoje em MCO2 teve como objeto de estudo um artigo de meta-análise (a referência do trabalho encontra-se na primeira postagem de ontem, 09.08.09).

Este é um tipo de estudo que visa a extrair informação adicional de dados pré-existentes através da união de resultados de diversos trabalhos e pela aplicação de uma ou mais técnicas estatísticas. É um método quantitativo que permite combinar os resultados de estudos realizados de forma independente (geralmente extraídos de trabalhos publicados) e sintetizar as suas conclusões ou mesmo extrair uma nova conclusão.



Portanto, trata-se de um tipo de análise de dados em que os resultados de vários estudos - sem que necessariamente algum deles tenha encontrado algo de significância estatística - são agrupados e analisados como se fossem o resultado de um único grande estudo.


Dessa maneira, o seminário de hoje não foi fácil, por isso mesmo foi programado para ser o último da série de seminários do módulo (embora não tenha sido o último, por razões circunstanciais).


Abaixo estão os vários pontos discutidos pelos alunos no seminário e resumidos pela monitora do módulo Tâmata Tarcila. Serão mencionados apenas os aspectos considerados negativos na análise coletiva do estudo sob apreciação.


(1) Título
- Houve sugestão para um título menos extenso, sem o artigo definido no seu início e mais completo em relação aos pacientes incluídos, considerando o tipo de fratura: “Efeito de corticosteróide na prevenção de embolia gordurosa após fratura de ossos longos e da pelve: revisão sistemática com meta-análise”.

(2) Resumo
- Não há uma equivalência de todos descritores na tradução do Português para o Inglês: "adrenal cortex hormones” e "corticosteróides"; "embolia gordurosa" e "embolism, fat" [com vírgula]; "metanálise" e "meta-analysis".
(3) Métodos- Não foi apresentada na discussão a explicação da escolha de diferentes palavras-chaves (unitermos) para as diferentes bases de dados.
- Não foi mencionada a necessária avaliação de três autores independentemente, que deveriam avaliar o estudo da qualidade dos artigos para extrair os dados relevantes e realizar um confronto entre as avaliações.
- Na avaliação de alocação sigilosa, feita de acordo com o Manual da Colaboração Cochrane, percebe-se que o primeiro critério de inclusão na revisão sistemática não foi atendido (como observado a seguir, em resultados).
(4) Resultados
- Dois estudos usaram alocação sigilosa inadequada. Dessa forma percebe-se que não se obedeceu estritamente ao primeiro critério de inclusão, de que seriam incluídos ensaios clínicos randomizados. Obviamente, os autores não mencionam o cegamento, mas a alocação sigilosa deveria prevenir (evitar) o conhecimento antecipado da alocação de grupos.
- Nos estudos incluídos não se analisaram apenas pacientes com fratura de ossos longos (diafisária ou não), mas também fraturas de pelve.
- Foi utilizada uma medida de tendência central inadequada para o nível de mensuração dos dados, o que pode ser verificado no seguinte trecho: "No estudo de Schonfeld et al. "fratura diafisária do fêmur recebeu pontuação 4 ao passo que outros tipos de fratura receberam pontuação 2 (colo do fêmur, pélvis ou tíbia) ou 1 (fíbula); a pontuação média do grupo do corticosteróide foi 4,19 e do grupo placebo 4,49”; como a variável considerada é de nível de mensuração ordinal, deveria ter sido usada a mediana e não a média.
- Há erro nos valores referentes ao número total de pacientes na tabela 1: a população total aparece com 410 pacientes nos seis estudos incluídos e afirma-se que a população total é composta de 389 pacientes. No entanto, apenas 360 foram incluídos na meta-análise pois 21 foram excluídos porque receberam glicose hipertônica.
-As figuras 1 e 2 estão com erros no eixo das abscissas, que possuem os seguintes intervalos: 1 – 1 – 10, mas o correto deveria ser: 0,1 – 1 – 10.
- O título da tabela 1 está incompleto; a tabela deveria ser auto-explicativa e o título "características dos estudos" é insuficiente. Deveria ser: "características dos seis estudos incluídos na revisão sistemática e meta-análise sobre o efeito de corticosteróide na prevenção de embolia gordurosa após fratura de ossos longos e pelve entre 1966 e 2005".
(5) Discussão
- Dever-se-ia ter sugerido convenientemente ao final do artigo a realização de estudos para esclarecer desfechos clínicos de pacientes com síndrome da embolia gordurosa, avaliando evolução para uso de ventilação mecânica e mortalidade, assim como pesquisas sobre a melhor dose para prevenir essa complicação.
- Não foi discutido o uso de diferentes palavras-chaves para a busca nos diferentes bancos de dados eletrônicos, deixando-se ao leitor a tarefa de concluir pela explicação da diferente extensão dos bancos pesquisados.


Crédito da ilustração da presente postagem: a figura que ilustra esta postagem foi retirada da seguinte página-web sites.google.com/site/bipolardatabase/

9 de agosto de 2009

Ao Mestre com Carinho

Professor Evandro Pinheiro do Egypto


“Ensinar é um exercício de imortalidade. De alguma forma continuamos a viver naqueles cujos olhos aprenderam a ver o mundo pela magia da nossa palavra. O professor, assim, não morre jamais... 
(Rubem Alves)

O Professor Evandro, reumatologista e fisiatra, formou-se em 1970 pela Faculdade de Medicina da Paraíba. Fez pós-graduação em Reumatologia pela Pontíficia Universidade Católica no Rio de Janeiro. Foi professor e chefe de disciplina e do serviço de Reumatologia do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Paraíba (hoje do Centro de Ciências Médicas), tendo sido fundador e professor de outros cursos da área de saúde. Foi presidente da Associação Médica da Paraíba e membro da Academia Brasileira de Reumatologia.
Para nossos colegas e alunos, não será preciso mencionar sua vasta experiência com reumatologista, professor e educador. Queremos lembrar de sua eloquência, sua maneira forte de expressar seu pensamento, seu espírito tenaz e sua incansável vontade de debater idéias, resultantes de sua grande experiência e espírito arguto. De personalidade marcante, típica de pessoas que assumem uma postura na vida, demonstrava claramente o que pensava. Foi um ser humano impossível de passar despercebido.
Ele tinha ideias claras a respeito do ensino médico. Acreditava que a educação dos estudantes deveria incluir humanidades ao lado dos conhecimentos técnicos. Nós o vimos enfatizar incansavelmente a importância de se valorizar a influência da esfera psicológica no adoecimento dos pacientes. Parafraseando William Osler, finalizamos esta breve e singela homenagem ao Prof. Evandro dizendo que não podemos esquecer como ele ensinava estudantes de medicina nas enfermarias.