26 de dezembro de 2008

O Normal e o Patológico Segundo Georges Canguilhem

Rilva Lopes de Sousa Muñoz

Como médicos, passamos grande parte do tempo distinguindo entre biologia “normal” e “anormal”.
Quando nos confrontamos com algo grosseiramente diferente do usual, não temos dificuldade de separar o normal do anormal. Todos nós conhecemos bem as fotografias de livros-textos clássicos de Semiologia Médica que mostram exemplos óbvios de bócio, elefantíase, ascite volumosa, por exemplo. Saber reconhecer este grau de anormalidade é uma tarefa simples.
Com maior freqüência, precisamos fazer distinções bem mais sutis entre normal e anormal. Uma dor torácica fugaz é um pleuris ou uma dor inconsequente? Um sopro cardíaco sistólico suave é um sinal de doença cardíaca valvar ou um "sopro inocente"? Níveis plasmáticos de fosfatase alcalina levemente elevados são um sinal de doença hepática, doença de Paget assintomática ou nenhuma delas?
Decidir o que é anormal torna-se ainda mais difícil entre pacientes atendidos na atenção básica à saúde, onde manifestações sutis de doença estão livremente mescladas com queixas habituais de pessoas saudáveis. Além disso, nem sempre é possível investigar todas as manifestações que nos suscitam dúvidas. Já no contexto hospitalar, onde os pacientes já foram triados e selecionados para receber assistência especializada, o que acontece nas enfermarias dos hospitais universitários, por exemplo, geralmente fica claro que alguma coisa está errada. A tarefa, então, é aperfeiçoar a descrição do problema e tratá-lo.
“O Normal e o Patológico” é o título de um livro que me chamou a atenção na estantes da Biblioteca Central da UFPB. "Que título mais semiológico!", pensei. Peguei imediatamente o livro e o folheei. Na página 26 encontrei a seguinte frase: “Esperávamos da Medicina justamente uma introdução a problemas humanos concretos”. Na p. 29: “Seria o estado patológico apenas uma modificação quantitativa do estado normal?” Nas páginas seguintes, pude verificar que o autor dissertava sobre o conceito de normal. E a questão fundamental colocada era: como a medicina estabelece o que é normal? Este livro soberbo foi escrito por Georges Canguilhem (1904-1995), e constitui um marco fundamental nesse novo campo do saber humano – a Epistemologia. Segundo o autor, a medicina, muito mais do que uma ciência propriamente dita, é uma técnica ou uma arte situada na encruzilhada de várias ciências. Este livro é, pois, uma tentativa de integrar à especulação filosófica alguns dos métodos e aquisições da medicina.
Para o filósofo, saúde é a “inconsciência do corpo”. O ponto de partida da análise de Canguilhem são duas frases de Leriche: “A saúde é a vida no silêncio dos órgãos” e “a doença é aquilo que perturba os homens no exercício normal de sua vida e em suas ocupações e, sobretudo, aquilo que os faz sofrer” (Leriche, 1936, citado por Canguilhem, [1966] 1982: 67). Em outros termos, saúde é a inconsciência do corpo, sendo a sua consciência despertada pelos limites impostos à saúde, ou seja, pela doença, seus sofrimentos e suas dores. Este é um entendimento que Canguilhem endossaria, na medida em que esta é uma definição de doença que deriva do doente e não do médico.
Canguilhem discute principalmente o uso ambíguo do termo normal como valor ou como fato, ou seja, que normalmente é aquele composto por norma (valor) e média (fato). Frequentemente, encontramos como resposta para a pergunta: “O que é o normal?” o enunciado: “a maior frequência estatística”. É como se o conceito de média fosse “um equivalente objetivo e cientificamente válido do conceito de normal ou de norma” (Canguilhem, 1982: 118). Mas como decidir, só com base em procedimentos estatísticos, dentro de que intervalos de variação com relação à uma posição média teórica os indivíduos ainda podem ser considerados normais? Reaparece a questão da subordinação da média – objetiva, descritiva – à norma – individual, avaliativa. Como afirma Canguilhem: “Um traço humano não seria normal por ser frequente; mas seria frequente por ser normal” (Canguilhem, 1995: 126).
A característica fundamental do conceito de saúde, como discutido na literatura, é reconhecida inicialmente na noção de “norma”, “regra”, tanto na Bioestatística quanto no senso comum. Uma breve análise do corpo da literatura revela algumas divergências nas definições de saúde. Para Canguilhem, a saúde pode ser caracterizada, como uma analogia, a um estado de “plenitude”, que seria o estado ideal. Mas não haveria diferentes níveis de normatividade (biológico, psicológico, social, moral)? Claro que há diferentes níveis de normatividade, dependendo do ângulo do qual se visualiza a questão. Para Canguilhem (1995; p. 183), "procurar a doença ao nível da célula é confundir o plano da vida concreta - em que a polaridade biológica estabelece a diferença entre a saúde e a doença - e o plano da ciência abstrata, no qual a doença de um ser vivo não se situa em determinadas partes do organismo". E ele continua, afirmando que quando alguém fala em “patologia objetiva”, quando alguém acha que a observação anatômica e histológica, que o exame bacteriológico, são métodos que permitem fazer cientificamente o diagnóstico da doença até mesmo sem nenhum interrogatório nem exploração clínica, se está cometendo a mais grave confusão.
Canguilhem diz que o patológico recebe a designação a partir do normal, não precisamente como a ou dis, mas como hiper ou hipo, diferindo a saúde da doença, o patológico do normal, como um atributo difere de outro. Com isso, podemos entender que aquele que recebe a nomenclatura ou rótulo de doente, o receba por enxergar de menos, ouvir de menos, sentir demais, com mais intensidade, as emoções da vida, como no caso de deficientes visuais e auditivos. De fato, a estatística traduz uma normatividade social, e que somos e nos enxergamos através dos nossos valores construídos, ou constituídos por nós. Em um contraponto com os aspectos deste trabalho, então a aplicação de um discurso que alcance a todos expressa os valores de acordo com o que a sociedade entende ser normal, e aquilo ou aqueles que, por algum motivo, não se encaixam nos padrões da normalidade.
A normalidade como média não expressa fielmente os achados clínicos e laboratoriais da medida da função dos órgãos ou organismos sadios, pois essas medidas oscilam em torno da média. Esta solução implica em considerar como normal uma faixa de distribuição. Levando-se em conta as características normais de uma população, considera-se como faixa indicativa dessa normalidade a expressão estatística que descreve a sua maioria. Resultados claros de diagnóstico (por exemplo, leucemia aguda, agranulocitose) decorrentes de um hemograma completo raramente apresentam sérias consequências diagnósticas na atenção primária. As fronteiras entre as anormalidades estatisticamente anormais e clinicamente relevantes e as investigações adicionais recomendadas nessas situações são, no entanto, menos claras.
Canguilhem reformula radicalmente os conceitos de Claude-Bernard de “doença”, “saúde” e “patologia”. A abordagem de Claude-Bernard e a de Canguilhem são duas abordagens diferentes desses conceitos. A visão de Claude-Bernard tem dominado a filosofia da medicina nos Estados Unidos, e é chamada de "reducionista" e "relativista". Os filósofos e os médicos americanos são geralmente familiarizados com os escritos de Claude Bernard (1813-1878), especialmente a sua Introdução ao Estudo Experimental de Medicina (1865), enquanto a epistemologia médica de Georges Canguilhem, que é francês, é praticamente desconhecida em nações de língua inglesa. Mas estas duas abordagens partilham o pressuposto básico de que o conceito de saúde não pode ser baseado apenas no biológico. Segundo Canguilhem (1995, p. 144)), “a fronteira entre o normal e o patológico é imprecisa para diversos indivíduos considerados separadamente, mas é perfeitamente precisa para um único e mesmo indivíduo considerado sucessivamente”.
Canguilhem identificou uma tensão entre as concepções de doença que surgiram nos séculos XVII e XVIII e outras também de longa data. As concepções mais antigas que ele identificou, como, primeiro, a tradição hipocrática, segundo a qual a doença é definida como um distúrbio dinâmico dos quatro humores, e, segundo, o impulso “ontológico” (a questão do ser enquanto verbo) para localizar a doença e, portanto, identificar os meios pelos quais doença aumenta ou diminui o funcionamento do indivíduo. Canguilhem acreditava que a teoria microbiana de Louis Pasteur, por exemplo, devia sua aceitação no final do século XIX à incorporação do desejo de “ver” e expulsar o agente etiológico de problemas de saúde. 
Para Canguilhem, Saúde e doença não eram mais qualitativamente opostas. Na abordagem de seus contemporâneos Auguste Comte e Claude Bernard, Canguilhem identificou uma suposição de que a ciência poderia avançar melhor estabelecendo continuidade entre saúde e doença. Isso, para Canguilhem, levantou a perspectiva de que o conceito de doença pudesse ser incluído em uma escala contínua de normalidade. Três de seus argumentos parecem pertinentes ao debate atual sobre o diagnóstico de transtorno de personalidade.
Primeiro, anomalia não seria anormalidade. Canguilhem estava preocupado com o fato de diferenças qualitativas, como a saúde e a doença, terem sido obscurecidas pela identificação de uma continuidade quantitativa. A diferença qualitativa entre cores, argumentou ele, não foi diminuída pelo fato de que cada uma poderia ser posicionada em um espectro de comprimentos de onda. Ele contrastou suas opiniões com as de Claude Bernard, argumentando que um homem saudável e um homem com diabetes mellitus diferem mais do que apenas a quantidade de glicose na corrente sanguínea. Um estado patológico não era simplesmente uma versão maior ou menor de um estado fisiológico. 
Canguilhem seguiu a ideia de que nenhuma lista de sintomas e sinais ou medida de desvio de uma norma estatística poderia formar a base de uma definição de doença.  Ele novamente usou o exemplo do diabetes para apontar para as relações entre diferentes funções biológicas e argumentou que é a contribuição deles para o mau funcionamento do organismo vivo como um todo que justifica o rótulo da doença. Ele citou os argumentos de Henry Ey com referência à doença mental: que o normal não é um correlato médio a um conceito social, nem um julgamento da realidade, mas um julgamento de valor. 
Segundo, Canguilhem defendeu que ser saudável significa ser capaz de se adaptar e superar obstáculos. A saúde permitia “uma margem de tolerância para as inconsistências do meio ambiente”. Terceiro, afirmou ele, esse processo de adaptação é ativo, e não passivo. O que caracteriza a saúde é a possibilidade de transcender uma norma, de tolerar infrações e de instituir novas normas em resposta. Essa qualidade ele chamou de “normatividade”. Os “seres normativos” são capazes de lidar com conflitos de uma maneira que deixa aberta a possibilidade de correção futura. Até um organismo doente exibiria normas biológicas. Na presença de uma infecção, um nível mais alto de anticorpos é “normal”. Um organismo é saudável na medida em que é capaz de se ajustar a essas normas diante das mudanças de circunstâncias. Quando a infecção se resolve, a contagem de leucócitos deve mudar. A condição patológica é aquela em que a nova norma seria incapaz de realizar esse tipo de ajuste. 
Assim, diversidade não significa doença.

Referências
CANGUILHEM, G. O normal e o patológico. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995.

18 de dezembro de 2008

And so this is Christmas...

So this is Christmas
And what have you done
Another year over
And a new one just begun
And so this is Christmas
I hope you have fun
The near and the dear ones
The old and the young
A very merry Christmas
And a happy New Year
Let's hope it's a good one
Without any fear
And so this is Christmas (...)
("Merry Christmas" ["Was is over"], John Lennon)

17 de dezembro de 2008

Mapa de Problemas


O Mapa de Problemas é uma técnica pouco conhecida usada em várias áreas do conhecimento, e resulta da transposição para a pedagogia em Medicina de um método de representação gráfica para o raciocínio clínico. Essa técnica de estudo resulta da associação do Modelo da Lista de Problemas de Weed e do Mental-Map ou Mapa Mental (Mind Map).

O "Mapa Mental", da qual deriva o Mapa de Problemas, já é uma técnica conhecida. Esta é um tipo de diagrama sistematizado pelo inglês Tony Buzan. No Mapa Mental utiliza-se um método gráfico simples para o registro de fatos, idéias e quaisquer tipos de conteúdos de aprendizagem. Como recurso didático usado em várias áreas do conhecimento, objetiva desenvolver o auto-aprendizado, facilitar a aquisição de conhecimentos, e atuar como estratégia para análise e solução de problemas. O Mapa Mental é um recurso gráfico que substitui o processo convencional de anotações sob a forma de listagem. Um Mapa Mental mostra a “fotografia” do assunto, evidencia a importância relativa das informações ou conceitos relacionados ao tema central e suas associações.
O procedimento consiste em uma forma diagramática desenvolvida sobre uma única folha de papel na posição horizontal, utilizando-se canetas coloridas para fazer as anotações. O assunto ou tema principal é escrito no centro da folha, e as idéias primárias que surgem randomicamente são registradas através de palavras-chave sobre linhas de ramificações partindo sempre do centro, que é o tema principal. O mapa tem significado somente para o próprio autor, que, portanto, não deverá preocupar-se com a estética ou, com diagramação bem distribuída. Este dispositivo mostra um mapa mental feito para explicar os usos para os mapas mentais, que na didática, tem aplicações tanto no ensino quanto na aprendizagem. 
A aplicação de mapas mentais é incipiente em medicina, mas já foram publicadas duas obras sobre essa técnica para a área de saúde: mapas mentais em medicina (McDERMOTT; CLARCK, 1998) e mapas mentais em patologia (DERVAN; HARRISON, 2002). Em recente pesquisa bibliográfica, encontramos três estudos publicados sobre a aplicação do mapa mental para estudantes na área de saúde, mas com avaliação a curto prazo de estudantes recém-treinados na técnica (WICKRAMASINGHE et al., 2007; JITLAKOLAK, 2005; FARRAND et al., 2002). 
O mapa de problemas derivou da referida técnica do Mapa Mental, e consiste em um instrumento para estruturar o conhecimento sobre o doente, e estimular o desenvolvimento do raciocínio clínico do estudante de medicina, idealizado por Broeiro et al. (2007). Este pode ser feito de várias formas, em configurações em cadeia, em hierarquia, em agregado, em árvore, entre outras conformações. A Lista de Problemas surgiu na década de 60, após publicação de Lawrence Weed (WEED, 1968), que desenvolveu um modelo clínico que permitia fazer un registro da informação colocando em foco todos os eventos relacionados o doente e, que não eram levados em conta porque não eram diagnósticos. A estes eventos, definiu como "problemas" e a esta consideração de eventos, de lista de problemas, considerando-se problema como qualquer item fisiológico, patológico, psicológico ou social que afete o paciente, e que pode ser um sinal, um sintoma, um resultado de laboratório anormal, uma limitação física, um aspecto psicossocial. 
Com base nessas premissas, realizamos uma experiência didática para desenvolvimento do raciocínio clínico em um curso prático extracurricular com alunos de graduação em Medicina, através do exercício do Mapa de Problemas através de um curso prático em uma experiência-piloto tendo como clientela estudantes de Medicina do quinto período do currículo tradicional, logo após o término da disciplina de Semiologia Médica, com o objetivo de aprimorar o raciocínio clínico (SOUSA-MUÑOZ et al., 2008). Este curso teve duração de quatro meses, e foi ministrado de forma extra-curricular, com estudo de um caso clínico semanalmente. As observações clínicas foram elaboradas pelas quatro alunas participantes, pela norma de anamnese tradicional, a partir de exames clínicos de pacientes internados nas enfermarias de clínica médica do do Hospital Universitário da UFPB. 
As observações clínicas geraram listas de problemas em disposição linear. Nessas representações em diagrama, os mapas de problemas mostraram as idéias organizadas em torno de um foco, a queixa principal de cada paciente. A partir da lista de problemas, estruturaram-se representações gráficas elaboradas à mão, com um tópico central, a queixa principal, a partir da qual irradiavam-se tópicos representados pelos itens: diagnóstico fisiopatológico, diagnóstico topográfico, sindrômico e etiológico, além da epidemiologia, do curso, diagnóstico diferencial e complicações. 
Na observações clínicas, a partir da queixa principal e da lista de problemas associados, hipóteses convergiram para diagnósticos sindrômico, fisiopatológico, topográfico, etiológico, complicações, curso, diagnóstico diferencial. Esta experiência levou as alunas a colher e analisar informações, listar problemas, elaborar hipóteses diagnósticas orientadas pelos problemas e correlacionar os dados, estruturando-se um diagrama com visão geral do raciocínio clínico. Assim, essa experiência didática permitiu pôr em prática o conhecimento teórico assimilado na disciplina de Semiologia, potencializando a capacidade de aprender nessa fase de iniciação à clínica. 
Portanto, consideramos que o Mapa de Problemas pode ser um subsídio no desenvolvimento do raciocínio clínico, ajudando o estudante de medicina a pensar de forma sistemática sobre os problemas dos pacientes, fazendo associações entre eles, e também com o conhecimento obtido anteriormente, potencializando-se seu aprendizado na iniciação à clínica. 

Referências 
BROEIRO, P. et al. Mapa de problemas: um instrumento para lidar com a morbidade múltipla. Rev Port Clin Geral, 23: 209-15, 2007.
McDERMOTT, P.; CLARK, D. Mind Maps in Medicine. Elsevier, 1998 
DERVAN, P.; HARRISON, M. Mind Maps in Pathology. Elsevier, 2002 
WEED, L. L. Medical records that guide and teach. N Engl J Med 278(11):593-600, 1968. WICKRAMASINGHE, A. et al. Effectiveness of mind maps as a learning tool for medical students. South East Asian Journal of Medical Education, 1 (1): 30-32, 2007. JITLAKOLAK, Y. The effectiveness of using concept mapping to improve primary medical care competencies among fourth year Assumption University. Au J T, 9 (2): 111-120, 2005 FARRAND et al. The efficacy of the 'mind map' study technique. Med Educ, 36: 426-31, 2002 
SOUSA-MUÑOZ, R. L. et al. Mapa clínico das enfermarias como ferramenta didática das aulas práticas de Semiologia Médica. In: 46 Congresso Brasileiro de Educação Médica, 2008, Salvador, Bahia. Anais/Resumos de Trabalhos, 2008. Disponível em: http://www.abem-educmed.org.br/anais.php

Crédito da foto - a foto desta postagem foi extraída de http://wwwdelivery.superstock.com/WI

13 de dezembro de 2008

Diagnóstico probabilístico: Acurácia



Os médicos dedicam grande parte de seu tempo diagnosticando a partir das queixas ou anormalidades clínicas de seus pacientes, chegando aos diagnósticos, depois de aplicar vários testes.

Um "teste diagnóstico" geralmente é concebido como um exame realizado em laboratório. Mas os princípios discutidos aqui também se aplicam à informação clínica obtida da anamnese ou exame físico. Pode-se falar do valor diagnóstico da artrite, cardite e coréia no diagnóstico da febre reumática, ou da hemoptise e da perda de peso em um fumante, como indicadores de câncer de pulmão.

Todos os clínicos aprendem que estabelecer um diagnóstico é um processo imperfeito, resultando em probabilidade e não em certeza de se estar correto. Assim sendo, precisam se familiarizar com as relações matemáticas entre as propriedades do teste diagnóstico e a informação que eles fornecem às várias situações clínicas. Em muitos casos, o entendimento destas relações auxilia a resolução de algumas incertezas em torno do uso dos testes diagnósticos. Em outras situações, pelo menos melhora o entendimento da incerteza.

Cabe, nesse ponto, revisarmos o conceito de acurácia, que muitas vezes é motivo de confusão e que é extremamente importantes para quem quer avaliar corretamente um teste diagnóstico, laboratorial ou não.

Acurácia de um teste é a relação entre o resultado de uma prova diagnóstica, seja ela laboratorial ou não, e a ocorrência da enfermidade que ela busca diagnosticar. Entende-se por "acurácia" a proporção de testes verdadeiramente positivos e verdadeiramente negativos, em relação à totalidade dos resultados. Portanto, a acurácia de uma estimativa é uma medida da correlação entre o valor estimado e os valores reais, ou seja, mede o quanto a estimativa que obtemos é relacionada com o "valor real" do parâmetro. Ela nos informa o quanto o valor estimado é "bom", ou seja, quanto o valor estimado é "próximo" do valor real e nos dá a "confiabilidade" daquela estimativa ou valor.

Sendo a acurácia é a habilidade o teste de obter resultados similares ao teste padrão-ouro, o conceito de precisão seria a reprodutibilidade dos resultados ao repetir o teste várias vezes, no mesmo ou em vários laboratórios, em circunstâncias similares. Portanto, precisão não implica acurácia.

Especialmente quando um novo teste diagnóstico é desenvolvido em Medicina, é necessário avaliar de forma objetiva o seu poder discriminativo em relação à doença ou condição a que se destina detectar. Essa avaliação é fundamental, pois o parâmetro de desempenho mais comumente utilizado, que é a porcentagem de testes cuja discriminação foi realizada corretamente (acurácia) não é suficiente para descrever completamente como o método de decisão se comporta em relação aos falso-positivos (pacientes que não tem a condição patológica, mas que o método de decisão aponta como tendo), e aos falso-negativos (o oposto do anterior). Evidentemente, um teste com boa acurácia, mas que produz um número inaceitável de falso-positivos ou falso-negativos, pode causar problemas.

A definição conceitual de acurácia do diagnóstico é baseada no pressuposto de que há ampla variedade de diagnósticos possíveis nas situações clínicas, além dos que são altamente acurados. Isto é, além de um diagnóstico altamente acurado, outros diagnósticos são aceitáveis com base nos dados existentes. Assim a acurácia de um diagnóstico não é uma qualidade dicotômica - a acurácia é um continuum. A acurácia envolve o esforço de diferenciar um diagnóstico dos outros diagnósticos possíveis para chegar ao diagnóstico que melhor expressa os dados disponíveis em dada situação.

São exemplos de pesquisas enfocando acurácia:
- "A acurácia para o diagnóstico clínico do melanoma, por um dermatologista, sem a utilização do dermatoscópio, foi estimada ao redor de 75 a 80% e mais baixa se estabelecida por residentes de dermatologia ou clínicos gerais. No entanto, com a utilização do exame dermatoscópico, pode-se alcançar acurácia diagnóstica de aproximadamente 90% para o diagnóstico de melanoma cutâneo."
- "Determinar a sensibilidade e a especificidade de três critérios diagnósticos de sobrepeso e de obesidade que utilizam o índice d emassa corpórea em escolares."
- "Sensibilidade e especificidade do exame físico e da história clínica no diagnóstico de insuficiência hepática crônica".
As letras apresentadas nas tabelas acima podem ser descritas assim:
a = verdadeiros positivos b = falsos negativos c = falsos positivos d = verdadeiros negativos a + b = total real de positivos a + c = total aparente de positivos.

Para saber quão preciso é o teste, duas medidas foram criadas: a sensibilidade e a especificidade. A sensibilidade mede a capacidade do teste em identificar corretamente a doença entre aqueles que a possuem, ou seja, o quão sensível é o teste. A especificidade mede a capacidade do teste em excluir corretamente aqueles que não possuem a doença, ou seja, o quão específico o teste é. Um bom teste possui um alto valor para a sensibilidade e para a especificidade, pois ele identificará corretamente aqueles que têm a doença e aqueles que não têm. Daí, entende-se que acurácia é a proporção de predições corretas (soma de positivos verdadeiros e negativos verdadeiros).Em um teste de laboratório para detecção de uma doença, com possíveis resultados as respostas positivo e negativo, podem-se obter erros de precisão ou mesmo de interpretação errada.

Quando o resultado for positivo, o indivíduo pode ter a doença (verdadeiro positivo - VP) ou pode não tê-la (falso positivo - FP). Da mesma forma, quando o resultado for negativo, o indivíduo pode não ter a doença (verdadeiro negativo - VN) como pode tê-la (falso negativo - FN). [ver figuras acima].

Na prática, esta é uma questão delicada, uma vez que a verdade nem sempre pode ser obtida com absoluta segurança. Por isso, é comum utilizar-se, como exame de referência indicador da verdade (denominado padrão-ouro), uma bateria exaustiva de testes complementares ou repetidos ou, ainda, o melhor teste conhecido. A aplicação deste exame de referência é, em geral, de alto custo e, portanto, as avaliações de validade de um teste são feitas em pequenas amostras de estudos, especialmente, delineados para este fim.

É deste modo que a Medicina Baseada em Evidências está influenciando todas as áreas da ciência médica, inclusive, a área diagnóstica. Com eixo na Epidemiologia Clínica e na Bioestatística, a Medicina Baseada em Evidências (MBE) vem ganhando defensores no mundo todo. Sua aplicação, inicialmente pedagógica, agora alcança horizontes muito mais amplos e chega à prática clínica diária. Parece não haver dúvidas de que não existe mais lugar para as expressões “na minha experiência”, ou “segundo a minha vivência”.


Embora as conclusões possam estar acertadas, é ético e moderno alicerçar decisões clínicas em evidências científicas criteriosamente definidas em bases epidemiológicas e estatísticas. Cada vez mais se abandonam os raciocínios e deduções alcançados a partir de experiências e observações que podem ou não ser casuais.

A prática clínica usualmente se depara com perguntas e incertezas, resultantes da primeira análise de informações oriundas do paciente. Os testes diagnósticos, laboratoriais ou não, são uma ferramenta valiosa que o clínico lança mão para, aliado ao seu juízo crítico e conhecimento prévio, estabelecer a etiologia das queixas ou anormalidades dos pacientes. Para a prática da medicina sob o novo paradigma da MBE, e da Semiologia Baseada em Evidências (SBE), tanto o médico quanto o analista clínico devem estar familiarizados com as questões que dizem respeito à precisão, exatidão e acurácia de um determinado teste, pois é baseado nestes conceitos básicos que estará centrada a discussão da aplicabilidade e da validade do resultado para o paciente em questão.

Referências
CAMPANA, A. O. Introdução à Investigação Clínica. São Paulo: Trianon, 1995
JEKEL, J. F.; ELMORE, J. G.; KATZ, D. L. Epidemiologia, Bioestatística e Medicina Preventiva. Porto Alegre: Artes Médicas, 1999.
FLETCHER, R. H.; FLETCHER, S. W.; WAGNER, E. H. Epidemiologia Clínica. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989
JEKEL, J. F.; ELMORE, J. G.; KATZ, D. L. Epidemiologia, Bioestatística e Medicina Preventiva. Porto Alegre: Artes Médicas, 1999.
PEREIRA, M. G. Epidemiologia: teoria e prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1995.

11 de dezembro de 2008

Projeto Continuum: Continuidade da Assistência ao Paciente com Doença Crônica





O Projeto Continuum, intitulado formalmente de "Ambulatório de Egressos de Internação da Clínica Médica do HULW/UFPB: Continuidade da Assistência ao Paciente com Doença Crônica" vem sendo desenvolvido no Hospital Universitário Lauro Wanderley há seis meses, e é vinculado ao PROBEX (Programa de Bolsas de Extensão).

A população-alvo é constituída por pacientes com idade igual ou superior a 18 anos, egressos de internação das enfermarias de Clínica Médica do HULW/UFPB, portadores de doenças crônico-degenerativas e que necessitem de cuidados permanentes (média complexidade).

A concepção deste projeto de extensão surgiu a partir da observação de que era necessário suprir a ausência de um programa de continuidade de assistência clínica ao paciente portador de doença crônica egresso da internação das enfermarias de clínica médica geral (Enfermarias de Propedêutica) do Hospital Universitário Lauro Wanderley (HULW)/UFPB.

Em virtude da percepção de que havia uma fragmentação da assistência pós-hospitalização e visando aumentar a eficiência do tratamento dos pacientes que recebem alta das enfermarias de Propedêutica do HULW, um grupo de médicos residentes do serviço, sob a coordenação da Profa. Dra. Isabel Barroso Augusto Silva, criou, há dois anos, o Ambulatório de Pacientes Egressos de Internação, para que estes não permanecessem sem o necessário acompanhamento clínico ambulatorial. Posteriormente, com o funcionamento deste ambulatório, percebeu-se que era necessário realizar sua reestruturação e sistematização do atendimento, com adoção de uma atenção em saúde de natureza multidisciplinar. Assim, propõe-se a adoção de um sistema que privilegie a assistência integral à saúde dos pacientes egressos portadores de condições crônicas após a internação hospitalar.

A principal ação extensionista do projeto Continuum consiste no desenvolvimento de processos assistenciais e metodologias de trabalho que permitam reavaliar periodicamente a gravidade das doenças crônicas de pacientes egressos de internações clínicas do HULW, visando à redução de reinternações, assim como à adequação do seu controle terapêutico. Paralelamente, será executado um processo educativo sobre o manejo domiciliar das doenças crônicas (inicialmente hipertensão, diabetes mellitus e doença renal crônica), de forma integrada ao atendimento ambulatorial, por meio de palestras e visitas domiciliares a um subgrupo de pacientes previamente selecionado.
Os alunos que participam do Projeto são seis alunos do Curso de Graduação em Medicina da UFPB e uma aluna do Curso de Graduação em Serviço Social (UFPB).

A ação da equipe do Projeto Continuum insere-se na missão institucional declarada pelo Hospital Universitário Lauro Wanderley, ou seja a de formar e aperfeiçoar recursos humanos, gerar conhecimentos, prestar assistência de qualidade e, através da maximização do aproveitamento da infra-estrutura instalada, transpor os próprios objetivos, atuando decisivamente na transformação de realidades e no desenvolvimento pleno da cidadania.

9 de dezembro de 2008

Projeto Continuum

Reconhecendo a existência de uma fragmentação do modelo assistencial pós-hospitalização dos pacientes que recebem alta das enfermarias de Clínica Médica do Hospital Universitário Lauro Wanderley (HULW), o Projeto de Extensão Continuum (PROBEX/CCM/UFPB) visa ao acompanhamento do paciente portador de doença crônica que recebe alta deste serviço.
O paciente portador de doença crônica geralmente é hospitalizado pela necessidade de tratamento de uma agudização clínica. Entretanto, apesar de constituir fator de extrema importância, após a alta hospitalar, a continuidade dos cuidados clínicos é um geralmente negligenciada. Atualmente, podem ser observados muitos pacientes com doenças crônicas permanecerem internados por longos períodos e, ao receberem alta hospitalar, muitas vezes ficam sem uma seqüência horizontal de assistência, como já observado no HULW, sobretudo nas enfermarias de clínica médica (SOUSA-MUÑOZ et al., 2002).
Define-se a “Continuidade de Cuidados” como a seqüencialidade, no tempo e no sistema de saúde, das intervenções integradas de saúde (TRAVASSOS; MARTINS, 2004). Portanto, são os cuidados prestados ao paciente continuamente desde seu contato inicial com o serviço de saúde, acompanhando-se o paciente durante todos os episódios de assistência médica. Essa continuidade dos cuidados clínicos já é considerada atributo essencial de bom funcionamento do sistema provedor de saúde (DE MARCO, 2005).
Com este entendimento, consideram-se de grande importância as ações que visem a aumentar e melhorar a integração da atenção hospitalar durante a internação com o seguimento ambulatorial do paciente portador de doença crônica. Esta ação assistencial de horizontalidade do cuidado apresenta inúmeros desafios, e é necessária a participação ativa do paciente.
Nesse contexto, o presente projeto enfoca a continuidade do cuidado, no sentido de reduzir o alto índice de nova hospitalização de portadores de doenças crônicas, como hipertensão arterial, diabetes mellitus, nefropatias e doença hepática crônica, enfermidades que apresentam elevada prevalência entre os pacientes internados nas enfermarias de clínica médica do HULW, constituindo uma intervenção que pode melhorar sua evolução, reduzindo, assim, a morbimortalidade dessa clientela.
Com base nesses fundamentos, o Projeto Continuum tem o objetivo de desenvolver ações assistenciais e métodos de trabalho que permitam acompanhar o paciente portador de doença crônica egresso de uma internação, priorizando a adequação de seu controle clínico através da continuidade do cuidado ambulatorial e de processos de educação popular em saúde.
Referências
DE MARCO, M. A. Abordagem integral e integrada. In: PRADO, F. C., RAMOS, J. A.; DO VALLE, J. R. Atualização Terapêutica. São Paulo: Artes Médicas, 2005. SOUSA-MUÑOZ, R. L.; MOREIRA, I. F.; MOURA, A. C. L. Relação entre sintomatologia depressiva e mortalidade hospitalar em idosos internados em enfermarias de clínica médica. In: V Encontro Paraibano de Psicólogos da área Hospitalar, 2002, João Pessoa, 2002. TRAVASSOS, C.; MARTINS, M. Uma revisão sobre os conceitos de acesso e utilização de serviços de saúde. Cad. Saúde Pública, 2004 . Disponível em: Acesso em: 09 dez 2008. Sobre o Projeto Continuum, um de nossos alunos extensionistas escreveu o texto abaixo, ao despedir-se, hoje, do trabalho.

O Projeto de Extensão Continuum tem por objetivo o acompanhamento de pacientes com doenças crônicas os quais não receberiam o atendimento necessário na pós-internação. Através desse projeto tais pessoas seriam, além de medicadas, educadas para um melhor controle de suas enfermidades, buscando, dessa forma, diminuir o número de internações, descompensações e mesmo de comorbidades advindas da própria doença de base. Tal ação reveste-se de grande importância, tendo em vista, dentre outros pontos, o fato de que muitos pacientes com doenças crônicas após a internação hospitalar são liberados às suas casas sem que haja agendamentos ou encaminhamentos a algum profissional qualificado para o seu acompanhamento, e mesmo até, em muitos casos, sem o adequado conhecimento sobre a afecção que os atinge. Dessa forma, esses pacientes estão fadados a reinterções por piora progressiva do seu quadro, ou mesmo por descompensações agudas.

O Projeto Continuum surge tendo por base o trabalho em duas esferas. Em um primeiro momento, na esfera do conhecimento. O paciente, durante o acompanhamento realizado, recebe informações sobre sua doença e como proceder no seu processo de auto-cuidado, além de receber apoio dos médicos e estudantes, de maneira tal que o paciente não se sinta só, animando-o para que o mesmo cumpra o que foi prescrito e recomendado.

Em uma segunda esfera de trabalho, busca-se o tratamento clínico. Esses pacientes necessitam de um acompanhamento por toda a vida, sendo de suma importância o seguimento da terapêutica adequada, com as devidas especificações de acordo com as necessidades individuais relativo ao momento que se passa. Assim, a consulta mensal, traz a esses pacientes um modelo mais estrito, onde ele acaba, ou devido ao receio de rever o médico em pouco tempo, ou mesmo pela sua animação por encontrar uma boa recepção quanto à doença que o acomete, seguindo o que a ele foi repassado. Dessa forma, obtém-se o controle da doença crônica, de maneira a tentar conter a progressão das comorbidades, bem como as descompensações.

O Projeto Continuum, no momento que concilia educação em saúde com o atendimento clínico, busca, através da explicação e do acompanhamento, evitar que muitos pacientes apresentem episódios agudos relativos à sua doença crônica, bem como que reduza-se o suegimento de complicações pela progressão da própria doença. Dessa forma, o Hospital Universitário, o qual apresenta uma grande procura por pacientes de todo estado, apresenta um bom desafogamento quanto ao número de leitos para esses pacientes que agora acompanhados, raramente necessitam de uma nova internação, as quais ocorreriam fatalmente em menor espaço de tempo.

8 de dezembro de 2008

Detalhes semiotécnicos da percussão dígito-digital

A PERCUSSÃO DÍGITO-DIGITAL
A percussão é uma técnica semiótica básica de exame físico e não deve ser menosprezada. Consiste em identificar os sons obtidos e a resistência oferecida por uma região do tórax ou do abdome,após um golpe dado com as pontas dos dedos, denominada percussão indireta, ou com a borda ungueal do dedo médio da mão direita sobre o dedo médio da mão esquerda, que está espalmada sobre a região a ser percutida, chamada percussão digito-digital. Golpeia-se com o dedo médio da mão direita (borda ungueal) a superfície dorsal da falange do dedo médio ou indicador da outra mão.
O dedo plexor é o que golpeia (dedo médio da mão dominante) e o plexímetro é o dedo golpeado. Para realizar a percussão, o dedo médio da mão esquerda é colocada firmemente sobre a área a ser percutida. Em seguida, o dorso da falange média é golpeado com a ponta do dedo médio da mão direita. O movimento deve ser feito a partir de articulações do punho e dedos, curvando o dedo percussor, ficando a sua falange terminal perpendicular aos metacarpianos quando o golpe é emitido.
A percussão sobre a projeção dos campos pulmonares normais produz um som de baixa frequência que é fácil de ouvir (designado por ressonância normal). Considera-se que a ressonância está aumentada quando a nota de percussão é mais alta.
A mão que percute pode adotar duas posições:
(a) dedos estendidos sem qualquer esforço (exceto dedo médio, que assume a posição semelhante a um martelo);
(b) o polegar e o indicador semi-estendidos e o anular e o mínimo fletidos de tal forma que se aproximem da palma da mão.
Alguns detalhes importantes de semiotécnica da percussão são os seguintes: a movimentação da mão se fará apenas com o punho; o cotovelo permanece fixo; o cotovelo permanece fletido em 90 graus e o braço em semi-abdução; o dedo plexímetro é o único a tocar na região examinada para não se abafar o som; o golpe é dado com a borda ungueal e não com a polpa do dedo, com certa obliquidade daquela para não machucar com a unha a falange distal do dedo médio esquerdo; as unhas devem estar curtas; a intensidade do golpe é variável (deve-se treinar para aprender a intensidade ideal); devem ser dados dois golpes seguidos, secos e rápidos para obter ritmo; em órgão simétricos é importante compará-los; a posição do paciente variará dependendo da região a ser percutida (e também a do médico); a percussão deve ser muito suave e superficial; se a parede estiver tensa aprofunda-se um pouco a percussão; o som obtido varia um pouco de pessoa para pessoa; dedos curtos e grossos obterão som mais nítido e de tonalidade mais alta. Alguns segredos da percussão: o treinamento deve ser repetitivo até obter automatização dos movimentos; a posição correta do examinador é atitude ereta, ombros relaxados, braços em semi-abdução (quase "colado" ao tórax); cotovelo em 90 graus; movimentos de flexão e extensão da mão em velocidade progressiva; pode-se treinar a percussão em um ponto (livro ou mesa) sem olhar; automatizar a menor força para melhor som; golpe forte para estruturas maciças e golpe fraco para estruturas com ar.
Os tipos de som: som maciço (parede, bloco de madeira, coxa) é o som obtido na área de projeção do fígado; som claro-pulmonar (livro grosso, caixa com isopor ) é o som do tórax normal; som timpânico (caixa vazia, tambor) é o som obtido sobre todo abdome e no espaço de Traübe (fundo gástrico) ou em qualquer área com ar sob membrana flexível
Outros tipos de percussão são: 1. PUNHO - PERCUSSÃO Mantendo-se a mão fechada, golpeia-se com a borda cubital a região em estudo, e averigüa-se se a manobra desperta sensação dolorosa 2. PERCUSSÃO COM A BORDA DA MÃO Dedos estendidos e unidos , golpeia-se, então, com a borda ulnar
* Percebe-se se há sensação dolorosa e caso positivo diz-se sinal de Giordano positivo, indicando afecção inflamatória retroperitoneal 3. PERCUSSÃO POR PIPAROTE - pesquisa de ascite Executa-se piparote em um hemiabdome, e com a mão espalmada, percebe-se movimento de ondas líquidas dentro da cavidade abdominal no outro hemi abdome.
UTILIDADE CLÍNICA DA PERCUSSÃO GERAL 1. Identificar a presença de ar livre, líquidos e massas na cavidade abdominal.
2. Dimensionar órgãos maciços como fígado e baço.
3. Identificar diferentes graus de irritação peritoneal, tendo em vista as variações da sensibilidade parietal.
4. Delimitar a área de um tumor.
5. Precisar o contorno de vísceras abdominais. 6. Identificar se há líquido, gás ou massa sólida na cavidade peritoneal.
* Gás - pneumoperitôneo - timpanismo * Líquido - ascite, cisto ovariano. * Massa - tumor. Observe que a percussão deve ser iniciada fora da área de maior sensibilidade e estender-se à todo abdome na mesma intensidade. 4. Sinal de Jobert: encontro de timpanismo na altura da linha axilar média direita, sobre área hepática, e sugere presença de ar livre na cavidade peritoneal decorrente via de regra de víscera oca; deve ser feito o diagnóstico diferencial com distensão abdominal por gases (indica-se Rx de tórax e abdome).
5. Um volume de líquido superior a 1,5 L pode ser detectada pela percussão, através da observação de macicez de localização constante ou variável a depender da posição do paciente.
6. Massas abdominais sólidas ou líquidas e os hematomas também são maciços à percussão.
7. Percussão limitante do fígado: o paciente deve estar com o tórax despido, e percute-se de cima para baixo, colocando o dedo plexímetro sobre os espaços intercostais ou paralelos a estes, na linha hemiclavicular, e então procura-se a mudança súbita de tonalidade sonora que corresponde à passagem do claro pulmonar à macicez absoluta do fígado ( porção deste aderido à parede costal); geralmente a macicez chega à altura do apêndice xifóide na linha média e do quinto espaço intercostal (12 dedos abaixo do mamilo ).
* Limite inferior do fígado: palpação e ausculta; a palpação não evidencia a parte que está sob o rebordo costal.
8. Baço: a percussão do baço é muito útil no diagnóstico de pequenas hipertrofias esplênicas que não ultrapassam o rebordo costal; o baço, ao se hipertrofiar, conserva sua forma normal, por isso cresce em direção inferior e para o interior, deslocando-se de sua posição normal (ântero-posterior) para região frontal; não se pode palpar a região póstero-superior do órgão porque a mesma está recoberta pelo pulmão e relacionando-se com a musculatura lombar. As causas de alteração do som normal do abdome à percussão:
1. Enfisema Subcutâneo: dá à percussão um som característico, o som timpânico.
2. Ascite livre/septada: macicez;
3. Tumores: som maciço;
4. Obstrução intestinal. Observe-se que o baço somente é palpável nas esplenomegalias resultantes de alterações patológicas, embora seja possível, à percussão dígito-digital, a percepção da sua borda superior, inclusive nos pequenos aumentos de volumes (de cerca de 6 cm2).
PERCUSSÃO TORÁCICA
É preciso salientar que a percussão atinge no máximo 5 cm abaixo da área da percussão e, portanto, pode localizar lesões nessa profundidade, não mais que isso.
É necessário percutir a face anterior e posterior do tórax, comparando os dois hemitórax de cima para baixo. Especial atenção deve ser dada ao percutir a face anterior, pois nela os sons não são homogêneos e num tórax normal, podemos obter os seguintes sons: som claro pulmonar (claro atimpânico), obtido na percussão dos campos pulmonares; som timpânico, obtido no espaço de Traube no epigástrio, e som submaciço, obtido na região inferior do esterno. O som maciço também é obtido à percussão da região inframamária direita (borda superior do fígado) e região precordial.
Ao se percutir a face posterior, é importante determinar o nível do diafragma e percutir a coluna vertebral (obtém-se o som claro atimpânico). Durante a percussão, é necessário prestar atenção para o fato de que obesidade, assim como massas musculares hipertrofiadas e edema, reduzem a nitidez dos sons normais, fazendo com que se torne submaciço ou mesmo maciço.

6 de dezembro de 2008

Reflexões sobre a visita médica em um hospital-escola

MARTINS, L. et al. Reflexões sobre a visita médica em um hospital-escola. Psic., Saúde & Doenças, v.4, n.1, p.69-82, 2004.
A visita médica faz parte da rotina de um hospital-escola. Nela, são apresentados casos e discutidas as condutas médicas, os exames, as cirurgias e os medicamentos. Visa atingir objetivos didáticos, constituindo um importante instrumento para o aprendizado dos estudantes e residentes de medicina. Entretanto, essa prática pode ter efeitos negativos sobre os pacientes.
Este estudo visou investigar os sentimentos e idéias despertados a partir da visita médica em pacientes internados na Enfermaria da Unidade de Transplante Renal (UTR) da Divisão de Clínica Urológica do Hospital das Clínicas da FMUSP. Foram entrevistados 55 pacientes e os dados foram analisados segundo o método qualitativo de análise do Discurso do Sujeito Coletivo.
Observou-se que a visita é percebida pelo paciente de maneira ambígua e conflitiva. Referem dificuldades para compreender o que é dito a respeito de sua doença e sentem-se desinformados, desamparados e excluídos de seu próprio tratamento. Por outro lado, sentem-se acolhidos e prestigiados quando recebem por parte de toda equipe, no momento da visita, atenção e informação sobre sua doença e tratamento. Foram feitas sugestões para o melhor aproveitamento da situação de visita médica no hospital-escola, de modo que, sem perder seu objetivo didático, ela possa assumir um papel mais efetivo na assistência ao paciente.

4 de dezembro de 2008

Conhecimento de médicos sobre morte encefálica

Estudo com médicos intensivistas do Rio Grande do Sul apontou que o seu conhecimento sobre o diagnóstico de morte encefálica (ME) é muito limitado, o que se atribuiu, em parte, ao pouco contato que os estudantes de medicina têm com este tema durante a graduação. RESUMO BITENCOURT, A. G V. et al. Avaliação do conhecimento de estudantes de medicina sobre morte encefálica. Rev. Bras. Ter. Intensiva, 19 (2): 144-150, 2007. (Embora o título indique que o trabalho foi feito com estudantes de medicina, a leitura do texto mostra que foram entrevistados médicos intensivistas, o que constitui um problema mais sério ainda) JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: A falha ou atraso no diagnóstico de morte encefálica resulta na ocupação desnecessária de um leito hospitalar, em perdas emocionais e financeiras e na indisponibilidade de órgãos para transplante. O médico intensivista tem fundamental papel nesse diagnóstico. O objetivo deste estudo foi avaliar o conhecimento sobre morte encefálica entre os intensivistas. MÉTODO: Estudo transversal em 15 unidades de terapia intensiva (UTI) em oito hospitais da cidade de Porto Alegre, Brasil. RESULTADOS: Duzentos e quarenta e seis intensivistas foram entrevistados em uma amostra consecutiva entre abril e dezembro de 2005. Encontrou-se prevalência de desconhecimento do conceito de morte encefálica de 17%. Vinte por cento dos entrevistados desconheciam a necessidade legal de exame complementar para o seu diagnóstico. Quarenta e sete por cento se consideraram no nível máximo de segurança para explicar o conceito para a família de um paciente. Vinte e nove por cento desconheciam a hora do óbito legal para os pacientes em morte encefálica. Os intensivistas pediátricos tiveram menor conhecimento do conceito em relação aos intensivistas de adultos. CONCLUSÕES: O atual conhecimento sobre morte encefálica é insuficiente entre os profissionais que mais freqüentemente se deparam com pacientes nessa situação. Há necessidade de educação sobre o tema a fim de evitar gastos desnecessários, diminuir o sofrimento familiar e aumentar a oferta de órgãos para transplantes. BITENCOURT, A. G V. et al. Avaliação do conhecimento de estudantes de medicina sobre morte encefálica. Rev. Bras. Ter. Intensiva, 19 (2): 144-150, 2007.

3 de dezembro de 2008

Exame clínico racional

Exame Clínico Racional
Por Ana Paula Freitas da Silva
Estudante do sétimo período de Medicina/ Centro de Ciências Médicas /UFPB, Monitora de Semiologia Médica
Estudos constatam que a maioria dos diagnósticos pode ser feita durante a história clínica e o exame físico. Além disso, muitos diagnósticos podem ser descartados neste momento. Os editores do Journal of the American Medical Association (JAMA) deram início, em 1992, a uma série chamada "O exame clínico racional". Desde então, cada artigo se refere a um determinado teste diagnóstico que pode ser realizado durante a anamnese e exame físico. O artigo discute a melhor forma de aplicar o teste e irá indicar a precisão, sensibilidade e especificidade do teste. Estudos dessa natureza são comumente realizados com testes laboratoriais, porém raramente são aplicados em relação ao exame físico.
Muitos diagnósticos iniciais podem ser realizados com base na história clínica do doente e no exame físico. No entanto, os médicos têm de conhecer a precisão e a exatidão dos diferentes testes diagnósticos que podem realizar. Precisão mede a probabilidade de que dois médicos, utilizando o mesmo teste para analisar o mesmo paciente, concordem que um sinal ou sintoma está presente. A acurácia é medida em termos de sensibilidade e especificidade: sensibilidade entendida como o teste que detecta uma condição quando ela está presente e especificidade compreendida como o teste que exclui a condição quando ele está ausente.
O exame clínico racional é conseqüência do paradigma da Medicina Baseada em Evidências, que tem por objetivo a tomada de decisões médicas através da identificação criteriosa, da avaliação e da aplicação das informações mais relevantes. O médico que investiu tempo para desenvolver uma abordagem baseada em evidências de um problema clínico comumente encontrado pode, mais tarde, poupar tempo pela redução de exames e tratamento desnecessários ou de encaminhamentos.
O esforço atual para reduzir os custos utilizados nos serviços de saúde vem alterando sobremaneira os incentivos para requisitar exames complementares mais onerosos. Isto legitima a importância do exame clínico tradicional, um efeito que só pode ser sustentado quando entendermos, usando a analogia dos testes de laboratório, a relevância de determinadas respostas obtidas dos pacientes (por exemplo, o poder preditivo da questão: "sua dor no peito se estende ao braço?" (para o diagnóstico de angina)) e dos achados encontrados no exame.
Deseja-se estimular novas investigações a fim de aprimorar o exame clínico. A posição de evidência poderia ser facilitada se houvesse o estabelecimento de um tipo de publicação em MEDLINE para "o estudo do teste de diagnóstico sistemático" e incluísse subtipos para avaliações do exame clínico e laboratorial, patologia e testes de diagnóstico radiográfico. O fato impressionante que mais de três quartos dos diagnósticos no cuidado preliminar podem ser estabelecidos durante o exame clínico é um indício de que a profissão médica deve encontrar tais aberturas.
O médico que sabe auscultar com domínio o coração de um paciente ocupa um lugar proeminente na arte médica. A contribuição dada pela série "Exame clínico racional", publicado no JAMA, mostrou imprecisões quanto à determinação de anormalidades, quando médicos generalistas auscultaram um sopro sistólico. Isso assinala que devemos aprender como fornecer experiências apropriadas que permitam que se coletem dados exatos e integrem, então, aqueles achados ao saber clínico.
Finalmente, é preciso focalizar à tomada de decisão médica na aplicação dos resultados do exame clínico. Isto requer um melhor entendimento de como contrabalançamos nossas suspeitas prévias sobre a presença ou a ausência de determinadas condições, favorecendo a análise diagnóstica.
Maiores investigações são necessárias a fim de decidir que precisão diagnóstica possuem determinados sinais e sintomas. Os esforços para reduzir custos desnecessários pelo sistema de saúde, eliminando testes diagnósticos desnecessários, repercutirá na maneira como o exame físico deve ser encarado. Ainda há pouca investigação para determinar a precisão do exame físico. Os setores responsáveis pela saúde deveriam investir nessa área de pesquisa, para evitar maiores gastos com exames adicionais. O sucesso final de tais esforços, entretanto, depende da disponibilidade, dos recursos, da perícia metodológica e da vontade de conduzir pesquisas dessa natureza.
Referências FRIEDLAND, D. J. Medicina baseada em evidências: Uma estrutura para a prática clínica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001. SACKETT, D. L. A primer on the precision and accuracy of the clinical examination. Journal of the American Medical Association, vol. 267, nº 19, p. 2638-2644, 1992. SACKETT, D. L; RENNIE, D. The science of the art of the clinical examination. Journal of the American Medical Association, vol. 267, nº 19, p. 2650-2652, 1992. SIMEL, D.L.; RENNIE, D. The clinical examination: an agenda to make it more rational . Journal of the American Medical Association, vol. 277, nº 07, p. 572-574, 1999

1 de dezembro de 2008

Doenças crônicas e adesão ao tratamento

As doenças crônicas não-transmissíveis reúnem um grande grupo de agravos que lideram as causas de morte nas áreas urbanas brasileiras. Além disso, o envelhecimento progressivo da população e o aumento da prevalência dessas doenças crônicas têm sido apontados como os principais fatores responsáveis pelo desenvolvimento de incapacidades na idade adulta.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as doenças crônicas atingem quase um terço da população brasileira. Em 2003, cerca de 7% (12,3 milhões de pessoas) dos brasileiros foram submetidos a uma ou mais internações hospitalares no ano anterior e, entre estes, 20,7% tiveram reinternações no mesmo período. Entre as pessoas com 65 anos ou mais de idade, a taxa de internação era duas vezes maior, 14% (IBGE, 2003).
A literatura parece unânime ao colocar como fundamental o papel da adesão no sucesso do tratamento de pacientes com doenças crônicas. Embora não seja um problema exclusivo do tratamento de doenças crônicas, por ser também muito freqüente em outros regimes de caráter prolongado, a falta de adesão ao tratamento nesse contexto se aprofunda em complexidade, parecendo ser determinada por vários fatores, interrelacionados ou não entre si.
O texto abaixo, escrito por um de nossos alunos do nono período de Medicina, aborda aspectos psicológicos e vivenciais relacionados a esse aspecto tão importante da prática médica.

Os pacientes com doença crônica em muito se diferenciam de outros pacientes. Tais pessoas passam muitos anos da sua vida convivendo com dificuldades e privações ocasionadas pela doença. Difícil é conseguir trazer tais pacientes para o nosso cuidar, de tal forma, que não fujam da estrutura de tratamento que se faz tão necessária. Como se sabe, esse tipo de doença, além de gerar muitos conflitos na vida psicossocial do doente enquanto trabalhador funcional, bem como ser de relacionamentos, ocasionando perda da qualidade de vida; aumenta os riscos para muitas outras patologias associadas, as quais, caso não haja adesão ao tratamento estipulado, terão progressão em velocidade acelerada, aumentando ainda mais a morbidade dessas pessoas. Adaptar-se à nova vida nem sempre é fácil, hábitos de anos, trabalhos de uma vida, relações de sempre; tudo se altera quando se tem o diagnóstico de uma doença crônica. Aceitar o problema, em determinados casos, pode ser o mais difícil, mais fácil é "fingir" que nada mudou, que nada de errado existe, que as coisas serão como antes. O médico a isso deve estar atento, um concordar muito esguio, um “vou tentar”, em geral escondem a discordância patente, a desilusão, nesse momento tão presente. A adesão ao tratamento nesse paciente é imprescindível, visto que sem o controle de sua doença não apenas os problemas diretos advindos da mesma se fazem preocupantes e responsáveis por uma alta morbidade, mas as patologias associadas decorrentes da doença de base são responsáveis em uma nova frente para a queda na qualidade de vida, chegando mesmo até uma incapacitação, em certos casos total. O tratamento nem sempre pode evitar a progressão da doença, contudo, ao menos, retardando-a, pode-se aumentar a sobrevida e diminuir a morbidade desses pacientes enquanto vida. Dessa forma, é mister que, por todo o período advindo posteriormente a essa enfermidade o tratamento se faça integralmente e em toda sua extensão temporal, ou seja, por toda a vida do paciente, sob pena de aumento da morbi-mortalidade deste. Não se podem ignorar os efeitos das lacunas assistenciais que permeiam o tratamento, e assim, a problemática dos múltiplos sistemas envolvidos em face das diversas patologias, direta ou indiretamente envolvidas. Esquecer, não se pode, das dificuldades psicológicas que estão presentes na vida desse paciente, que não mais terá sua vida como antes enquanto ação e relação. Sendo assim, mesmo um suporte psicológico pode vir a ser necessário, lembrando sempre da importância da adesão à conduta para a vida futura do doente, e que este apenas será verdadeiramente um paciente, quando verdadeiramente o médico for um homem, enquanto ser humano.

Referência
IBGE 2003 Doenças crônicas atingem quase um terço da população brasileira. http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php?id_noticia=370&id_pagina=1. Acesso: 21 fev 2008.

29 de novembro de 2008

Inspirar Esperança

"Ele é o melhor médico, o que é o melhor inspirador de esperança"
(Samuel Taylor Coleridge)

Perfil de morbidade hospitalar por doenças respiratórias do adulto no HULW/UFPB


As doenças do trato respiratório respondem por uma grande parte dos atendimentos prestados por médicos generalistas e muitas vezes essas doenças requerem atenção ao nível secundário ou terciário. Nesse aspecto, os registros de morbidade obtidos de estatísticas hospitalares são úteis para fornecer dados mais precisos sobre os tipos de doenças mais prevalentes ou como estudos exploratórios para pesquisas e programas de atenção médica à população atendida.

A pneumologia constitui capítulo importante no âmbito hospitalar dada a diversidade da patologia respiratória e o peso epidemiológico que as doenças respiratórias podem atingir. Apesar dos esforços existentes em prevenir doenças ao nível primário de atenção à saúde, a demanda pelos escassos recursos ao nível hospitalar é cada vez mais importante. Nesse contexto, o conhecimento das patologias respiratórias mais freqüentes na nossa instituição pode contribuir no sentido de desenvolver capacidade de desempenho na área de promoção da saúde, da prevenção, do diagnóstico precoce, da terapêutica e da reabilitação destas situações.

Em um levantamento epidemiológico das doenças respiratórias como causa de internações hospitalares no serviço de clínica médica de referência para o Sistema Único de Saúde, o nosso hospital universitário, localizado no litoral da Paraíba, verificamos que as doenças do trato respiratório responderam por um percentual significativo do total de internações internações no intervalo de 01 de janeiro de 1998 a 01 de janeiro de 1999 na Clínica Médica do HULW (SOUSA-MUÑOZ et al., 1999).

O Hospital Universitário Lauro Wanderley (HULW) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) é considerado um hospital de base, que desenvolve, além das ações de hospital regional, procedimentos mais complexos, de tecnologia mais avançada, constituindo serviço terciário de referência na região. A população atendida se caracteriza por ser de baixa renda, vivendo em condições geralmente precárias no que concerne a indicadores de qualidade de vida. A enfermaria de Clínica Médica do HULW dispõe de 70 leitos onde são atendidos anualmente cerca de 700 pacientes, procedentes da capital, de cidades do interior da Paraíba e de cidades de estados vizinhos.

Verificamos que no intervalo de 01 de janeiro de 1998 a 01 de janeiro de 1999, houve 127 internações por doenças do trato respiratório na Clínica Médica do HULW, o que correspondeu a 17,8% do total de internações no setor nesse período. A idade dos pacientes variou entre 15 e 93 anos, com média de 51,1 ± 19,7 anos. Observou-se que 76,5% dos pacientes encontravam-se na faixa etária da meia-idade ou velhice.

As doenças mais freqüentes foram pneumonias (28,3% dos casos) e doença pulmonar obstrutiva crônica agudizada (20,5%), seguidas por tuberculose pulmonar (16,5%), derrames pleurais de várias etiologias (9,4%), bronquiectasia (7,1%), sinusobronquites (7,1%), asma (6,3%) e câncer de pulmão (2,4%). As queixas que motivaram a internação foram relacionadas ao trato respiratório em 82,8% dos casos, e o restante foi constituído por sintomas gerais (17,2%). O período de permanência hospitalar variou de um a 75 dias (21,6 ± 15,8), havendo antecedente de internação em 33,1% dos casos, dos quais apenas 19,7% por doença respiratória.

Esses resultados concordaram com os dados da literatura e reiteram a importância de doenças como pneumonia, DPOC e tuberculose pulmonar na clientela do HULW. Conclui-se pela importância da determinação do perfil epidemiológico de pacientes portadores de doença do aparelho respiratório atendidos no HULW a fim de melhor direcionar programas de saúde a essa clientela. Dez anos depois, estamos verificando o mesmo perfil no nosso serviço, para avaliar alterações de morbidade na nossa clientela (Perfil clínico-epidemiológico do adulto hospitalizado na clínica médica do HULW: Subsídios para ações de ensino, pesquisa e extensão; projeto de pesquisa da Monitoria de Semiologia Médica, 2008).

Referência:

SOUSA-MUÑOZ, R. L. et al (1999). Perfil de morbidade por doenças respiratórias em pacientes acima de 15 anos na clientela do HULW. XX Congresso Médico da Paraíba, João Pessoa-PB, 1999.

27 de novembro de 2008

Comunicação do diagnóstico ao paciente com doença grave

Comunicação do diagnóstico ao paciente com doença grave Por Bruno Melo Fernandes
Estudante do sexto período do Curso de Medicina - Centro de Ciências Médicas - UFPB; Extensionista do Projeto Continuum (PROBEX/UFPB)
Apesar de todos os avanços científicos e tecnológicos, existe uma variedade de doenças que são intensamente associadas à possibilidade de sofrimento físico, emocional e morte. Nesse contexto, algumas características do paciente como o nível social, econômico e cultural, além de sexo e idade são alguns dos fatores que interferem no nível de impacto psicológico que o diagnóstico de doença grave pode causar no indivíduo. A partir disso, é comum que os médicos tenham dúvidas em como abordar o paciente portador de doença grave. Surgem questionamentos sobre se o paciente deve ter plena informação sobre sua doença e se o profissional de saúde estará recebendo adequada formação nas escolas e embasamento psicológico e psicossocial para esta delicada parte do exercício de sua profissão. Apesar de todos os avanços da medicina no estudo da relação médico-paciente, pouca ênfase tem sido direcionada aos programas de treinamento relacionado à habilidade de comunicação e avaliação do fator psicossocial, requisitos necessários a um ótimo atendimento de pacientes portadores de doença grave. Os profissionais dependem então de sua experiência e julgamento pessoal quando têm que tomar decisões sobre quando, quem e como deve ocorrer esta comunicação. A informação negativa referente ao diagnóstico, prognóstico e progressão da doença é difícil porque para os médicos pode estar faltando um método para fazê-lo e também porque este tipo de informação pode trazer reações emocionais ou comportamentais de parte do paciente que são incômodas para ambos. A apreensão da reação do paciente pode levar o profissional a adotar estratégias para adiar as más notícias. É importante que o profissional que revela um diagnóstico de doença grave, esteja integrado a uma equipe multidisciplinar, para que o paciente seja devidamente encaminhado e receba seu tratamento. Tanto a realização de exames diagnósticos como o tratamento só podem ser instituídos com o consentimento do paciente e ele também deve ser esclarecido sobre os possíveis resultados de seu tratamento. A comunicação do diagnóstico marca o início de uma série de mudanças negativas na vida do paciente. A qualidade de comunicação entre paciente e profissional, está relacionada ao seu ajuste emocional à doença e ao envolvimento do paciente e seus familiares no tratamento e deve ser valorizada. É necessário que os profissionais de saúde tenham uma conduta pautada pelos valores humanos e não apenas pelos valores técnicos e terapêuticos. O atendimento de um profissional de saúde, na circunstância de uma doença grave, busca compreender uma angústia, um pedido de ajuda. Assim, o profissional precisa aplicar sua sensibilidade para lidar com o ouvir e o sentir de uma pessoa fragilizada, pela doença, pelo tempo que perdeu para chegar ao diagnóstico e pelas tentativas frustradas de solução de seu problema.

24 de novembro de 2008

Semiologia Baseada em Evidências

O diagnóstico médico envolve três elementos básicos: a história obtida do paciente, os sinais detectados no exame físico e os resultados da investigação complementar. Apesar do surgimento de novos e precisos exames laboratoriais e de imagem, é fundamental manter a busca dos dados semiológicos na sua profundidade, obtendo uma história clínica minuciosa e um exame físico detalhado, na busca de possíveis alterações sugeridas pela anamnese. Uma abordagem que integre os três elementos para um diagnóstico acurado é fundamental.
Lemos nos livros-texto de Semiologia, e também sendo repetido pelos professores de Clínica, que a anamnese representa aproximadamente 80% do diagnóstico. De onde vem esse aforisma? De estudos de pesquisa avaliando a acurácia do exame clínico! No clássico estudo de Hampton et al (1975), em pacientes ambulatoriais, a concordância do diagnóstico inicial obtido através da anamnese com o diagnóstico definitivo foi de 82,5%, sendo o exame físico e o laboratório elementos fundamentais para o diagnóstico em apenas 8,6% dos pacientes, respectivamente. Também no estudo prospectivo de Roshan e Rao (2000), a história clínica levou ao diagnóstico correto em 78,6% dos pacientes, o exame físico em 8,2% e a avaliação laboratorial em 13,27% dos casos, em nível ambulatorial. Nesse estudo, em uma escala de 0 a 10, a confiabilidade para o diagnóstico correto aumentou de 6,36 após a anamnese para 7,57 após o exame físico, e para 9,84 após os resultados laboratoriais.
Estes dados não diminuem a importância do exame físico completo e detalhado e de exames complementares selecionados, mas ressaltam que os três grandes elementos do diagnóstico clínico - anamnese, exame físico e investigação complementar – têm a sua relevância e limitações em cada etapa da investigação médica, e em cada contexto clínico específico.
Um não faz sentido sem o outro, mas os dois juntos, anamnese e exame físico de boa qualidade, são fundamentais na prática clínica. As evidências empíricas de precisão e acurácia do exame clínico são utilizadas diariamente na assistência clínica.
Contudo, são abundantes os sinais e técnicas de exame clínico descritos nos livros-texto de Semiologia Médica, tanto antigos e não re-editados, quanto nos mais recentemente publicados. Esses livros de iniciação ao exame clínico pecam, muitas vezes, por repetir conceitos que talvez não sejam fidedignos ou válidos na realidade clínica do nosso meio.
O que se sabe por observação empírica é que o exame clínico bem elaborado além de ser mais barato, tem maior sensibilidade e especificidade para a maioria dos diagnósticos que exames complementares sofisticados (e caros). Por outro lado, observa-se que ao lado de técnicas de exame clínico com probabilidade de acerto muito baixo, existem outros métodos semiológicos e sinais clínicos comprovadamente mais eficientes que muitos dos exames complementares desnecessariamente solicitados pelos clínicos. É preciso, então, que haja um interesse de pesquisadores clínicos e de professores de Semiologia Médica no sentido da elaboração de um texto da disciplina realmente original e baseado em evidências científicas.
Por isso, precisão e exatidão do exame clínico deveriam ser mais pesquisados. É nesse sentido, e em virtude da importância fundamental do método clínico, que Macedo et al. (1994) afirmam que os sinais observados através do exame físico deveriam ser avaliados com o mesmo rigor metodológico com que são testadas as técnicas de laboratório, com avaliação de sua validade e fidedignidade. Atualmente pode-se recorrer a análises estatísticas que permitem calcular a sensibilidade, especificidade e valores de predição de sinais clínicos, como também a existência de métodos e técnicas que podem ser utilizados como padrão-ouro para este cálculo.
O interesse por este assunto, em todo o mundo, é cada vez maior. O Journal of the American Medical Association (JAMA) vem publicando, desde 1992, uma série de súmulas sobre o uso racional de exame clínico, em uma seção denominada "O exame clínico racional".
Sítios da Internet onde podemos ler sobre a acurácia do exame clínico:
http://www.carestudy.com/ Clinical Assessment of the Reliability of Examination www.sgim.org/clinexam.cfm Clinical Examination Research Interest Group
Referências
HAMPTON J. R. et al. Relative contributions of History-taking, Physical Examination, and Laboratory Investigation to Diagnosis and Management of Medical Outpatients. BMJ 1975; 2: 486-489.
ROSHAN, M.; RAO, A. P. A Study on Relative Contributions of the History, Physical Examination and Investigations in Making Medical Diagnosis. JAPI 2000; 48(8): 771-775.
MACEDO, J. L. S.; SANTOS NETO, L.; MACEDO, V. A importância clínica dos achados do exame físico do aparelho cardiovascular. Revista Brasileira de Educação Médica, v. 18, n. 2, p. 49-94, 1994.