27 de fevereiro de 2010

Uso de antihipertensivos e hipotensão ortostática

Hipotensão ortostática em pacientes sob terapia antihipertensiva nas enfermarias de clínica médica do HULW/UFPB 
Rilva Lopes de Sousa-Muñoz, José Luís Simões Maroja, Edson Magno de Macedo Júnior, Xiankarla de Brito Pereira, Chiara Rocha Brandão

INTRODUÇÃO 
Cerca de 10% a 20% dos pacientes hospitalizados apresentam efeitos indesejáveis a medicamentos. A hipotensão ortostática (HO) é um para-efeito comumente atribuído ao uso de drogas vasoativas, sobretudo os antihipertensivos. Tais medicamentos constituem uma prescrição frequente para pacientes hospitalizados, porém a frequência de HO como efeito indesejável neste contexto clínico é pouco investigada.
Drogas como diuréticos, vasodilatadores e bloqueadores adrenérgicos centrais podem predispor à HO por interferirem nos mecanismos reflexos compensatórios da PA. Por isso, o controle do paciente em tratamento anti-hipertensivo deve ser sistematicamente feito em várias posições, pois a queda da pressão arterial (PA) pode determinar HO, especialmente no início da terapêutica (CARVALHO et al., 1994). 
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que a PA deve ser rotineiramente medida na posição sentada ou supina seguida pela medida em posição ortostática (NETEA et al., 2002). Carvalho et al. (1994) definem HO como sendo a queda de 30% ou mais da pressão arterial sistólica (PAS), quando se assume a postura vertical após estar em posição sentada ou deitada. Por outro lado, Mader (1997) define como sendo a redução maior ou igual a 20 mmHg na PAS, ou redução maior ou igual a 10 mmHg após passar da posição supina ou sentada para a ereta. Andrade e Silva (1998), bem como Hachul (2002), consideram que apresentam HO aqueles pacientes que apresentam, além da diminuição maior ou igual a 20 mmHg na PAS ou PAD, associação de sintomas como tonturas, visão turva ou síncope, quando da mudança da posição supina para a posição ereta. 
O problema de pesquisa proposto é: se 10% a 20% dos pacientes hospitalizados apresentam efeitos indesejáveis a medicamentos, e os anti-hipertensivos são uma prescrição frequente neste contexto clínico, qual a freqüência de HO em uma enfermaria de clínica médica?

OBJETIVOS 
(1) Determinar os agentes hipotensores mais usados nas enfermarias de clínica médica (CM) do Hospital Universitário Lauro Wanderley (HULW)/UFPB, e (2) Avaliar a frequência de hipotensão ortostática (HO) entre os pacientes em uso de tais medicamentos no referido serviço. 

METODOLOGIA 
 O estudo foi observacional e transversal. Foram incluídos no estudo 30 pacientes de sob tratamento anti-hipertensivo nas enfermarias de clínica médica do HULW/UFPB. Os critérios de inclusão foram: hipertensos em uso de anti-hipertensivo (em monoterapia ou associação) e idade acima de 18 anos. Os critérios de exclusão foram: arritmia cardíaca, doenças neurológicas, diabetes mellitus, alcoolismo, anemia, uremia e gravidez. Para coleta dos dados, foi elaborado um formulário para registro das medidas da PA, freqüência cardíaca e sintomas de hipofluxo cerebral. Considerou-se a ocorrência de HO como a redução maior ou igual a 20mmHg na PAS e/ou igual ou maior a 10mmHg na PAD após mudança de posição (NETEA et al., 2002; MADER, 1997), e/ou declínio de mais de 30% na PA média (PLUM, 1997). Foi feita a medida casual da PA pelo método indireto, com técnica auscultatória, empregando-se esfigmomanômetro de mercúrio devidamente calibrado. A pressão foi medida na posição supina e ortostática (sentada e em pé), em ambos os braços. Inicialmente mediu-se a PA na posição supina, e posteriormente mediu-se novamente a PA na posição sentada e em pé, três minutos após cada mudança de postura (CUNHA et al., 1997). A análise estatística foi descritiva e inferencial. As comparações foram feitas através de testes não-paramétricos (Mann-Whitney, Wilcoxon e Kruskal-Wallis) a 5%, usando-se o programa estatístico SPSS, versão 17 para Windows

RESULTADOS 
Estes são os resultados preliminares do estudo, que se encontra em fase de coleta de dados, atingindo-se 30% da amostra final calculada. A idade variou dos pacientes variou entre 19 e 83 anos, com média de 42,69 (±20,42) anos; 65,5% na faixa etária de 19 a 50 anos e 34,5% com idade superior a 50 anos, sendo 20% com 60 anos ou mais ; 55,2% do sexo masculino; 34,5% tinham como diagnóstico principal de doença renal, 27,6% de doença cardiovascular e 24,1% de doença endócrina. O número de anti-hipertensivos prescritos variou de 1 a 4 (1,66±0,77); 14 (48,3%) usavam monoterapia e 15 (51,7%) faziam uso de duas ou mais drogas. Em regime de monoterapia, um inibidor da enzima conversora (captopril) foi o mais empregado (34,5%), sendo seguido pelo diurético furosemida (31%), pelo beta-bloqueador propranolol (30%) e pela nifedipina (4,5%). Em associação, 60% usavam furosemida associada ao captopril, enquanto 40% usavam furosemida (ou hidroclorotiazida), captopril e nifedipina. 
Observou-se HO em sete pacientes (24,1%), sendo sintomática em 42,8% destes (visão turva, tontura). Houve diminuição significativa da PA média (p=0.02), e da PAS (p=0.0001) na mudança da posição supina para a sentada, conforme pode ser observado na figura 1. Não foi observada diferença entre a posição sentada e a posição em pé, assim como não se observou nenhuma alteração estatisticamente significativa na PAD. Não se observou relação estatisticamente significativa entre a ocorrência de HO e as variáveis idade, sexo e tipo de hipotensor usado. 

DISCUSSÃO 
A frequência de HO encontrada nesta amostra foi significativamente menor que a prevalência relatada por Potocka-Plazak & Plazak (2001), que observaram HO assintomática em 53.3% de uma amostra de mulheres hospitalizadas. No entanto, estas pacientes usavam vasodilatadores de ação direta em 30% dos casos. Na nossa amostra, predominou o uso de captopril, diuréticos, propranolol e associações destas drogas que, apesar de não apresentar um potente efeito direto, também podem levar a HO. 
Por outro lado, Panayiotou et al. (2002) não observaram significativa queda na PAM com a mudança de posição supina para ortostática em 40 pacientes hospitalizados em uso de terapia anti-hipertensiva. O mecanismo antihipertensivo dos diuréticos está relacionado, numa primeira fase, à depleção de volume e, a seguir, também pode levar à redução da resistência vascular periférica decorrente de mecanismos diversos. O propranolol tem um mecanismo anti-hipertensivo complexo, e além de envolver a diminuição do débito cardíaco (ação inicial), reduz a secreção de renina, leva à readaptação dos barorreceptores e diminuição das catecolaminas nas sinapses nervosas. O captopril age fundamentalmente pela inibição da enzima conversora, bloqueando, assim, a transformação da angiotensina I em II, com efeito vasodilatador. Assim, o efeito dessas drogas sobre a PA é determinada pela combinação de efeitos no tônus vascular e um efeito indireto mediado pelo reflexo barorreceptor. Diferenças no efeito da função barorreflexa afeta a responsividade a essas drogas, embora a sua magnitude não seja conhecida (JORDAN et al., 2002). É preciso salientar que há diferenças entre as características das amostras dos estudos citados e a nossa. Além disso, diferentes critérios foram usados para definir HO. 
Além disso, efeitos de alguns anti-hipertensivos sobre a PA casual sofrem influência de variações do ritmo circadiano em pacientes com hipertensão essencial, observando-se maior queda da PA à tarde e à noite (HAYASHI et al., 1995). Esta variável não foi controlada no nosso trabalho, pois as avaliações dos pacientes foram realizadas tanto no período da manhã como à tarde. 
A redução que foi observada na PA média da posição supina para a posição sentada foi acompanhada por um aumento significativo da FC, indicando uma HO simpaticotônica do ponto de vista fisiopatológico, como uma resposta cardíaca compensatória apropriada, sugerindo que os mecanismos autonômicos dos pacientes avaliados estão intactos (CUNHA et al., 1997). 
A ausência de relação de HO com a idade pode ter sido resultante do pequeno tamanho da amostra, uma vez que estes são resultados parciais do presente estudo. É possível que, com o aumento da amostragem, possam ser detectadas diferenças na redução da PA com a mudança de posição. No entanto, para Ferrari (2002), embora o envelhecimento seja acompanhado de significativas modificações cardiovasculares, tanto do ponto de vista estrutural quanto funcional, o controle barorreceptor da PA é relativamente preservado na meia-idade. 
Nesse sentido, Wang et al. (2002) compararam a função reguladora autônoma sobre o sistema cardiovascular entre homens jovens e de meia-idade para avaliar o efeito do envelhecimento sobre esta variável, não encontrando diferença na variação da PAS nem da PA média com a mudança de posição entre os dois grupos etários. No entanto, para os pacientes jovens a variação na sensibilidade barorreflexa correlacionou-se com variações na FC, enquanto que para os pacientes de meia-idade estas correlações não foram observadas, o que levou os autores a concluírem que entre pacientes de meia-idade correlações entre FC e função barorreflexa são reduzidas. No entanto, diferenças etárias nos mecanismos reguladores provavelmente devem ter contribuído para este achado. Não encontramos estudos abordando a relação entre ocorrência de HO e o sexo dos pacientes. 
Quanto à ausência de relação entre HO e tipo de antihipertensivo, tal achado também pode ser devido ao pequeno tamanho da amostra, pois os dados indicam um maior decréscimo da PA média em pacientes que usavam captopril e associações de drogas, embora esta diferença não tenha alcançado significância estatística.

CONSIDERAÇÕES FINAIS 
(1) Os antihipertensivos mais usados nesta amostra foram os IECA e os diuréticos, observando-se igual frequência entre uso de monoterapia e associação de hipotensores; 
(2) A ocorrência de HO foi freqüente sendo assintomática em cerca de metade dos casos; A redução da PA com a mudança de posição ocorreu nos dados referentes à PA média e à PAS; 
(3) Em virtude das complicações que podem advir deste para-efeito dos hipotensores, esses pacientes deveriam ter como rotina o controle sistemático do tratamento anti-hipertensivo em posição ortostática. 

As referências bibliográficas mencionadas no texto acima podem ser solicitadas através de comentários após esta postagem ou pelo e-mail: rilva@ccm.ufpb.br.

Figura da postagem: Netter's Internal Medicine - 2nd Edition - http://www.netterimages.com/