4 de abril de 2011

Relatório da I Discussão em Grupo de MCO3 em 2011.1


Introdução

O artigo objeto de leitura crítica discutido em grupo na última aula de MCO3 foi sobre a ocorrência de sintomas em idosos no seu último ano de vida. Esta temática foi escolhida em virtude da relevância do rápido processo de envelhecimento da população brasileira, o que constitui hoje um problema de saúde pública. 

Nesse sentido, na formação profissional em Medicina, destaca-se atualmente a implantação das novas diretrizes curriculares para a graduação e a educação permanente no preparo de recursos humanos para a atenção básica, com conteúdos e competências orientados para as especificidades do processo de envelhecimento.

A incorporação do conceito de competência na aprendizagem revaloriza o lugar da prática pela exposição dos alunos a situações diversas, consolidando esquemas de mobilização de recursos cognitivos e afetivos. Sua incorporação trará consequências para o ensino, para as práticas e para a pesquisa.

No artigo selecionado, os autores tratam da ocorrência, detecção e tratamento de sintomas em idosos de uma comunidade de baixa renda de São Paulo (SP, Brasil) em seu último ano de vida, a a partir das informações verbais de seus cuidadores.

Objetivo da Discussão em Grupo

Propôs-se esta técnica como uma metodologia ativa de aprendizagem, em que a análise crítica do estudo pelos alunos constitui um exercício didático e de estímulo à sua formação científica.

Método da Prática Pedagógica Empregada

No grupo de discussão do módulo de MCO3, é feita uma análise crítica do estudo escolhido, considerando-se aspectos metodológicos, de estilo e de apresentação do artigo, com o intuito de exercitar o espírito analítico dos alunos em metodologia científica.

Todos os alunos da turma leram previamente o artigo selecionado para a discussão e que foi enviado por e-mail uma semana antes.

Encerrada a discussão, uma providência ex-post faz-se necessária: a divulgação dos resultados e a contribuição de cada um dos participantes. Para Ferreira (1994), esta é uma parte importante em qualquer discussão em grupo ou seminário. Todas as observações levantadas pelos alunos são relatadas, focalizando os aspectos que mais se destacaram na discussão.

A ordem de participações foi definida pela listagem de alunos matriculados em ordem alfabética, embora tenha sido facultada também participações espontâneas.

Discussão com a Turma

Iniciou-se a discussão com Alisson, que considerou o título elucidativo, adequado, refletindo o conteúdo do artigo, além de incluir também o modelo do estudo, o que trouxe mais informação àquele.

Nesse sentido, Antônio considerou que o título pareceu-lhe extenso, ainda que contivesse subtítulo. Concordei que o título foi adequado, embora pudesse excluir a palavra "frequência", uma vez que não foi avaliada apenas a frequência de sintomas, mas também a sua detecção e tratamento pela equipe de saúde. Por outro lado, o termo "frequência" poderia ser suprimido do título sem prejuízo nenhum deste.

Artur Nóbrega opinou, por sua vez, que o desenho do estudo foi bem delineado, mas faltou um aspecto importante: o cálculo do tamanho da amostra. Afirma-se apenas na seção de Métodos: "Almejou-se realizar entre 80 a 100 entrevistas". Artur ponderou ainda que outros estudos citados no artigo em questão e que abordaram problemas de pesquisa semelhantes continham amostras de tamanho muito maior.

Arthur Trindade enfocou a Introdução do artigo, considerando que os autores aprtiram do contexto geral da temática para o problema específico, embora não o tenham formulado explicitamente. Contestou a ausência de fundamentação para a escolha dos sintomas incluídos na investigação, questionando se aqueles eram realmente as manifestações clínicas mais comuns entre os idosos de baixa renda no Brasil. Os sintomas escolhidos foram baseados em estudos com idosos americanos e ingleses.

Beatriz chamou atenção para a relevância do tema e para o fato de ser inédito no Brasil o estudo do problema investigado. Ela completou sua participação salientando a contribuição para a prática clínica dos resultados, sobretudo a alta frequência de falta de detecção de sintomas na amostra estudada.

Bruno iniciou sua participação comentando que, embora se tenha realizado o confronto dos resultados do estudo com os de outras publicações de trabalhos semelhantes, esta comparação não foi suficientemente clara. Contudo, considerou apropriada e necessária a exposição das limitações do estudo que foi apresentada pelos autores na seção de Discussão.

Reginaldo interveio indicando que os autores não fundamentaram por que realizaram uma avaliação dos cuidadores após três meses da morte dos idosos. Questionou se esta fase seria uma etapa importante do luto. Consideramos que há fases no luto normal e que os rituais tradicionais como a missa de sétimo dia, de um mês e de um ano constituem marcos nesse processo de luto normal. Apesar de o luto ser aparentemente um mecanismo universal, cada indivíduo tem uma forma única de o realizar e o processo varia não só de pessoa para pessoa, como também existem diferenças entre faixas de idade e gênero. Concordamos que não foi fundamentada esta escolha temporal para abordagem dos sujeitos.

Mathews participou comentando que os autores não consideraram como processo de inclusão a aceitação dos sujeitos da pesquisa e sua assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Camilla ressaltou a abordagem "póstuma" dos sujeitos em relação à morte dos idosos, o que não constitui uma abordagem comum, e por isso, considerou inovador este aspecto da técnica de entrevista dos sujeitos. Questionou ainda, como Artur Trindade anteriormente, se os sintomas incluídos no formulário de coleta de dados da pesquisa eram os mais frequentes na população estudada. Ponderamos que alguns sintomas são comuns a idosos de todos os níveis econômicos, porém faltou a inclusão de aspectos relacionados à capacidade funcional do idoso, como por exemplo, a capacidade de execeção de atividades básicas da vida diária.

Daniel, por sua vez, comentou que a revisão teórica foi muito extensa na Introdução, com o que concordamos, pois muitos trabalhos relatados com detalhes, um a um, poderiam ter sido inseridos na Discussão do artigo, realizando-se, mais convenientemente, uma abordagem concisa na Introdução. Daniel percebeu ainda que não são propostas hipóteses nesta seção, e se isso constituiria uma falha metodológica. Respondemos que, como se trata de um estudo descritivo e exploratório, não há a necessidade formal de proposição de hipóteses.

Danielle apontou a existência de referências antigas, como várias da década de 1990. Considerou ainda que na seção de Resultados há redundância de descrição de dados no texto e nas tabelas. Nesse sentido, apontou ainda a falta de concisão na página 78, oitavo parágrafo, com o que concordamos.

Eduardo Jorge indicou a ausência de formulação explícita do problema de pesquisa, além de comentar uma das grandes limitações do estudo, ou seja, o viés de memória, já que os respondentes foram entrevistados retrospectivamente em relação à morte dos idosos. Tal limitação foi mencionada pelos autores na seção de Discussão.

Vanessa questionou se os sintomas pesqusiados não deveriam estar dispostos mais apropriadamente em um quadro na seção de Métodos. Ponderamos que no texto, embora tenham ocupado mais espaço, foi necessário explicar a terminologia mais acessível que foi apresentada aos respondentes, como por exemplo, dispnéia ("falta de ar"), fadiga ("perda de energia"), entre outros.

Mariana afirmou que considerava mais adequado que se tivesse sido critério de inclusão dos participantes da pesquisa apenas aqueles cuidadores principais dos idosos, isso teria provavelemnte minimizado vieses de informação, uma vez que, na seção de Resultados, verifica-se que 15% dos cuidadores entrevistados não eram os cuidadores principais dos idosos.


Geísa apontou para a existência de diferenças entre o conteúdo do Resumo do artigo em relação ao seu texto principal, como por exemplo, os locais de recrutamento dos sujeitos. Comentou ainda o provável viés de informação em dois aspectos importantes, tais como a informação sobre o sintoma dor, que é uma variável subjetiva e que só o próprio idoso poderia caracterizar adequadamente, assim como a variável depressão, que não poderia ser avaliada apenas com a pergunta referente à presença de "desânimo" ou "baixo astral". Depressão pode ser um sintoma, uma síndrome ou uma doença. Essa variável deveria ser adequadamente avaliada através de escalas padronizadas de sintomas depressivos, sobretudo porque estes são atípicos no idoso.


Para Gilson, o grande problema do delineamento foi a coleta de informações a partir dos cuidadores. A obtenção dessas informações poderia ter sido realizada mais acuradamente através da revisãos e prontuários médicos. Contudo, lembramos o fato de que o objetivo do estudo era também avaliar se os sintomas apresentados pelos idosos eram detectados pela equipe de saúde. Por outro lado, na ausência do paciente, o informante mais próximo é o seu cuidador principal.


Gilson ainda questionou a validade externa do estudo, cujos resultados não poderiam ser generalizados para a população geral. Entretanto, o objetivo do estudo foi avaliar os sintomas dos idosos de baixa renda no seu último ano de vida e, portanto, a aplicabilidade dos resultados do estudo restinge-se apenas a esta parcela da população.


Na sua vez, Gustavo salientou a relevância do estudo no sentido de sua contribuição para melhorar a qualidade de vida da população-alvo da pesquisa, por demonstrar a existência de negligência da equipe de saúde em detectar e tratar problemas que esses idosos apresentavam em sua fase terminal de vida. Por outro lado, comenta ainda a falta de menção a treinamento dos pesquisadores que realizaram a coleta de dados. Nesse sentido, Mariana lembrou que houve apenas um pesquisador na coleta dos dados, e esse fato foi favorável à obtenção de maior homogeneidade desta.


Luiz Alberto afirmou que poderia ter sido investigada também a causa primária de óbito dos idosos. Esta informação seria, então, correlacionada aos sintomas apresentados. Concordamos que essa medida enriqueceria o trabalho, porém não foi esse o objetivo do estudo, e sim, a determinação dos sintomas apresentados e sua detecção e tratamento no último ano de vida.


Mathews apontou outra uma inconsistência entre Resumo e texto principal do artigo, no que concerne ao número de sintomas investigados. Além disso, comentou que o problema de pesquisa não foi apresentado explicitamente na Introdução. Questionamos, então, qual seria o problema de pesquisa da investigação, colocado de forma explícita. Opinamos que o problema seria: "É alta a frequência, duração e ausência de tratamento de sintomas no último ano de vida de idosos de baixa renda de São Paulo?"


Murilo apontou para a falta de menção clara aos critérios de elegibilidade dos participantes do estudo, ressaltando o fato de que a partir de 205 indivíduos, foram selecionados apenas 81. Complementamos esta crítica com a existência de omissão de informações sobre os motivos de exclusão do grande número de sujeitos que não foram envolvidos na pesquisa.


Renan afirmou que poderiam ter sido investigados os hábitos de vida dos idosos através dos cuidadores respondentes, como questões referentes ao estilo de vida, tabagismo, alcoolismo, alimentação. Ponderamos, entretanto, que não é possível abranger todas as variáveis de uma situação, e em certa medida, é preciso eleger as que serão focalizadas, excluindo outras, em virtude da delimitação do problema de pesquisa.


Rodrigo também ressaltou a relevância da temática e a implicação prática dos resultados, pois se percebe que a medicina em particular, e o sistema de saúde, em geral, não está preparada para atender esse grande contingente de idosos da atualidade e do futuro próximo.


Thays salientou a restrita validade interna do estudo, uma vez que a acurácia das informações obtidas a partir dos cuidadores é limitada, em virtude do viés de memória, da baixa capacidade deses informantes de caracterizarem sintomas subjetivos, e até do viés representado pela influência emocional de perda relativamente recente do familiar. Concordamos com esta opinião, no entanto, consideramos que estas limitações de validade interna não chegam a invalidar o estudo. Todavia, é importante que se tenha em mente a existência de tais limitações na interpretação das evidências apresentadas no artigo.


Vanessa considerou que a conclusão foi concisa e clara, mas apontou a falta de uniformidade referente ao uso simultâneo do estilo impessoal mesclado com o uso da terceira pessoa do plural em várias seções do artigo.


Reginaldo fez críticas ao estilo do texto. Aproveitamos a oportunidade para denunciar a existência no texto do artigo de vícios de linguagem inaceitáveis na redação científica, tais como o eufemismo ("falecidos") e de gerundismo ("precisa estar enfrentando").

Por fim, Mariana perguntou se não teria sido necessário definir "Cuidados Paliativos" na Introdução do artigo. Respondemos que o objetivo do estudo não estava fundamentado nessa área, porém acabou culminando com uma recomndação relacionada a este tipo de atenção clínica.  Aproveitamos esta ocasião para ressaltar a importância desse conceito, que é relativamente recente, e que abrange uma atenção aplicada desde os estágios iniciais de uma doença progressiva, crônica e provavelmente fatal em curso.  No Brasil, com o número de pessoas com doenças crônico-evolutivas cada vez maior, sobretudo idosos com doença em fase avançada, torna-se crucial a preparação de profissionais e serviços de saúde para essa realidade.

Referência empregada no Relatório

FERREIRA, L. G. Redação Científica: Como escrever artigos, monografias, dissertações e teses. Fortaleza: Edições UFC, 1994.

Fonte da Imagem:
acpinternist.org