25 de novembro de 2011

Manifestação Pública em Defesa do Hospital Universitário Lauro Wanderley / UFPB



 25 de novembro de 2011: Campus da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), João Pessoa, Paraíba - Marcha dos estudantes de Medicina, Enfermagem e Nutrição da UFPB, e dos médicos residentes do Hospital Universitário Lauro Wanderley (HULW), pelo fim do "sucateamento" do nosso hospital-escola, o HULW.



O Hospital Universitário Lauro Wanderley (HULW), da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), encontra-se em grave crise.

O HULW é uma instituição de referência para o estado da Paraíba há mais de três décadas, polarizando o atendimento hospitalar e ambulatorial para todos os municípios do estado. O HULW presta cuidados terciários e de grande porte, com leitos destinados a pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS), e a população atendida se caracteriza por ser de baixa renda, vivendo em condições geralmente precárias no que concerne a indicadores de qualidade de vida.

Contudo, o HULW também é essencialmente um hospital de ensino. Só no Curso de Medicina, fazem treinamento neste serviço cerca de 500 alunos de graduação e 32 de pós-graduação, além dos alunos dos Cursos de Nutrição, Enfermagem, Psicologia, Serviço Social e Fisioterapia, contando, ainda com estagiários de outras instituições públicas. De encontro às orientações do novo Projeto Pedagógico do Curso de Medicina, ressalta-se a adoção do princípio pedagógico da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, como eixo específico e fundamental da ação deste projeto, e o HULW contribui decisivamente para essas três ações acadêmicas. 

Repercussão: Reportagem publicada no Jornal Correio da Paraíba em 26/11/12 - Único jornal de João Pessoa que, até agora, repercutiu a manifestação estudantil de forma mais abrangente.
Transcrição na íntegra abaixo.
Por Tássio Ponce de Leon
http://m.correio10.com.br/noticia/9830/reitor-ve-indicios-de-fraude-no-hulw

O reitor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Rômulo Polari, afirmou ontem, em sessão pública realizada no auditório da reitoria, que há indícios de irregularidades na gestão do Hospital Universitário Lauro Wanderley (HULW). Segundo ele, por esse motivo, uma auditoria está sendo concluída até a próxima semana, para identificar por que o HU, apesar de ter tido um acréscimo de 21% em suas verbas, enfrenta, neste ano, a pior crise de sua história. Antes do pronunciamento, médicos residentes e os internos dos cursos de Medicina, Enfermagem e Nutrição fizeram um manifesto que deu início à paralisação de suas atividades, a qual se estenderá até a próxima quarta-feira. Eles afirmam que, além da carência extrema de materiais de consumo médico e equipamentos, chega a faltar comida para os pacientes.

“Esta é uma crise anunciada. Já vínhamos acompanhando esse problema há algum tempo, porém não podemos afirmar os motivos até que o relatório do controle interno esteja concluído. Mas, é preciso deixar claro o que está acontecendo. No ano passado, o HU recebeu R$ 19 milhões e não havia crise. Neste ano, o orçamento foi de R$ 23 milhões, 21% superior ao ano anterior, superior também à inflação, que foi de 6,5%. Por isso, essa falta de verbas tem que ser esclarecida. Por que em 2010 não houve esses problemas? Por que o orçamento não dá mais?”, questionou-se o reitor Rômulo Polari.

Segundo o pró-reitor de administração da UFPB, Marcelo de Figueiredo Lopes, o SUS repassa mensalmente ao Hospital Universitário Lauro Wanderley entre R$ 1,3 e R$ 1,35 milhão, por mês. “O grande problema do HU é fazer uma aplicação mais racional dos recursos. O superintendente gasta, só com o pagamento de terceirizados, cerca de R$ 855 mil. Para se ter uma idéia, de julho de 2010 a julho de 2011, esses gastos cresceram 60%. Fora isso, ainda pagam dívidas a terceirizados antigos na ordem de R$ 147 mil. Se você fizer a soma, vai dar mais de R$ 1 milhão só com esse segmento”, enfatizou.

Diretor do HU nega irregularidades; R$ 4,1 milhões estão à disposição

O superintendente do Hospital Universitário, João Batista, afirmou que sua gestão tem sido bastante transparente. “Desde que eu assumi o hospital universitário, em julho de 2010, eu adotei uma forma de fazer o serviço público bem transparente. Todas as despesas do hospital são encaminhadas para nossa assessoria de comunicação, para que eles coloquem essas contas, mês a mês, no site do hospital. Nada é escondido. Tudo está demonstrado lá”, disse.

O superintendente afirmou, entretanto, que a crise do HU iniciou-se pela falta de recursos para a compra de materiais de consumo médico e foi multiplicada pela aposentadoria em massa dos profissionais. “Já dizia um professor que eu conheço que ‘a saúde não tem preço, mas custa caro’. O hospital recebe em média R$ 1,3 milhão, por mês, mas, para manter todos os setores funcionando adequadamente, necessitaríamos pelo menos de R$ 4,5 milhões. Esse é o problema”.

Com relação aos R$ 4,1 milhões que o HU estava para receber da diretoria nacional dos Hospitais Universitários, no montante de R$ 4,1 milhões, o superintendente João Batista informou que o crédito orçamentário já está disponível para o uso do hospital. “Recebemos hoje a quantia de R$ 4.134.784,77 para o custeio do HU. Iniciaremos hoje a solicitação dos materiais à empresa responsável. Como são muitas coisas, devemos concluir em quatro dias esse processo. Depois disso, a empresa tem de 10 a 15 dias para fazer a entrega. Também recebemos, por fora, outros R$ 977 mil para a compra de um tomógrafo, em uma semana. O Ministério da Educação está procurando ajudar, não posso negar isso, mas a situação é grave”, disse.

Patrimônio da saúde pública

O professor e médico do HU, José Luís Maroja, afirmou que o hospital está enfrentando sua pior crise dos últimos vinte anos. “O HU tem passado, desde o final da década de 80, por crises, porém, nestes últimos meses, o aprofundamento das deficiências está tornando o trabalho praticamente impossível, tanto para os médicos, quanto para os residentes, quanto para os internos, mas, sobretudo, para os pacientes. Digo sempre que nosso patrão é o povo. A crise está prejudicando a todos, mas principalmente a população mais carente. Para se ter uma dimensão, o HU recebe pacientes de todo Estado, de Cajazeiras a Cabedelo”, contou.

José Luís Maroja informou também que a culpa para essa situação não pode ser atribuída inteiramente à direção do hospital. “Em termos de hotelaria, o hospital está oferecendo uma boa parte da estrutura, porém, em termos de hospital terciário que é, sendo uma referência no Estado, deixa muito a desejar. Isso não é culpa inteiramente da direção do HU. Não queremos achar os culpados, mas isso envolve também a Secretaria Estadual de Saúde, a Secretaria Municipal de Saúde, o MEC, o Ministério da Saúde. Existe uma necessidade de todas as autoridades locais e federal de entrar com esforços conjuntos para reverter este quadro, pois o Lauro Wanderley é o maior patrimônio da saúde pública do Estado”, enfatizou.

Para Marluce Frazão, funcionária do bloco cirúrgico, essa crise não tem precedentes. “Faz 30 anos que trabalho aqui e, durante todo esse tempo, nunca pensei que ia passar por uma situação como essa. Isso está acontecendo de agora, não é uma coisa que tenha acontecido antes”, disse. A funcionária do serviço especializado de atendimento à mãe e à criança do HU, Rosilda Vicente do Nascimento, tem o mesmo pensamento. “Em 37 anos de serviço público, nunca vi isso. O HU está na UTI e eu estou indo parar lá também. Isso é muito triste”, lamentou.

Nutrição e Enfermagem aderem ao movimento; 280 param

A paralisação das atividades que estava prevista para contar apenas com os cerca de 230 médicos residentes do Hospital Universitário Lauro Wanderley e internos do curso de Medicina da UFPB ganhou, na manhã de ontem, a adesão dos internos dos cursos de Enfermagem e Nutrição, que somam, aproximadamente, 50 pessoas. No total, o HU deixará de contar, até a próxima quarta-feira, com 280 profissionais. As áreas afetadas serão: pediatria, ginecologia e obstetrícia, cirurgia geral, saúde coletiva, clínica médica, infectologia, anestesiologia, psiquiatria, oftalmologia, gastroenterologia, medicina intensiva e dermatologia.

Os residentes do curso de Medicina informaram que, mesmo com a paralisação, os hospitais universitários devem funcionar, por lei, normalmente. “Os residentes estão fazendo apenas uma pós-graduação com a atuação em área prática específica. Já os internos estão no quinto e sexto anos do curso de Medicina, mas eles nem são médicos ainda”, contou Pricilla Antunes, residente em cirurgia geral. “O hospital que quiser trabalhar com residentes tem que pedir credenciamento a uma comissão nacional, que vai avaliar as possibilidades, de acordo com as condições estruturais. Mas, sem os residentes, o hospital deve continuar a funcionar normalmente”, disse a residente Lorena Sousa Oliveira.

Apesar de paralisados, os internos e residentes promovem, até a quarta-feira, diversos movimentos. Já na segunda, eles participarão de uma audiência pública com a reitoria da UFPB, com a direção do Centro de Ciências Médicas, com o Sindicato dos Médicos da Paraíba, com a Superintendência do HU e com o Conselho Regional de Medicina. Na terça, participarão de uma audiência com o Ministério Público Federal, para denunciar o caos em que se encontra o hospital, inclusive sobre a paralisação dos serviços de cirurgia cardíaca, cirurgia geral e obstetrícia. Por fim, na quarta-feira, eles vão fazer parte de uma reunião do Conselho Deliberativo do HU, exigindo transparência na gestão dos recursos do hospital.

Falta comida para os pacientes; enfermagem também está prejudicada

Internos do curso de Nutrição da Universidade Federal da Paraíba denunciaram ao CORREIO que, nas últimas três semanas, começou a faltar até comida para os pacientes. “Eles não passam fome, mas, para você entender, só temos carne até domingo. Depois disso, não sabemos o que vamos oferecer, porque não há nenhuma variedade”, afirmou Giulia Grisi. A interna Samira Pereira confirmou que o quadro é complicado, porque há casos de pacientes que têm certas restrições alimentares e não há alternativas a oferecer. “Nessas situações, temos que improvisar. Às vezes fazemos um ovo, uma omelete. Ficamos de mãos atadas”, lamentou.

Carolina Vasconcelos, também interna do curso, informou que, além da carência de alimentos, também faltam suplementos para os pacientes e até bandejas em que são servidas as refeições. “Alguns pacientes têm uma necessidade de complementar sua nutrição diária com os suplementos, mas até isso está acabando. Alguns, que só se alimentam através de sondas, necessitam bastante disso. Estamos chegando ao ponto de ter que fazer suplementos caseiros, para que essas pessoas não fiquem subnutridas, mas, mesmo assim, isso é bastante complicado, porque não se pode comparar o suplemento industrializado com esse feito por nós”, disse. Com relação às bandejas, utilizavam-se as de plástico, por serem higiênicas, mas, como estão em falta, têm sido usadas as de alumínio.
Para os internos em enfermagem Manoel Neto e Laires Cavalcante, os trabalhos para os enfermeiros também está muito debilitado. “A enfermagem se tornou a arte do improviso. Não temos material. Falta tudo”, disse Laires. “Os médicos prescrevem os procedimentos, medicamentos, e cabe a nós, os enfermeiros, tomar esses cuidados. Mas, como, se não temos nenhuma condição?”, desabafou Manoel.

“Antes de o HU parar, paramos nós”

Revoltados com o caos instalado no Hospital Universitário, médicos residentes, internos em Medicina, Nutrição e Enfermagem, professores e estudantes utilizaram faixas pretas nos braços para indicar luto diante da falência do HU e, alguns, narizes de palhaços. Juntos, realizaram um abraço simbólico ao hospital, seguida de uma caminhada à reitoria, onde se realizou a sessão pública com participação do reitor, Rômulo Polari.

O clima era de revolta. “Estamos nesta situação porque a direção do hospital deixou as coisas correrem frouxas”, disse Pricilla Antunes, médica residente. “Eles estão brincando conosco? Querem deixar o HU morrer para privatizar depois?”, questionou-se um professor vestido de palhaço, que não quis se identificar além da denominação “Palhaço Au”.

O reitor Rômulo Polari também mostrou-se insatisfeito com a situação do HU. “Investimos bastante na unidade coronariana, fechada no ano passado, bem como em reformas, como as que vamos iniciar na semana que vem. Porém, não temos visto retorno”. Apesar disso, deu garantias aos residentes. “Vamos reverter esta situação”.

Notícia veiculada pelo Jornal Correio da Paraíba em 26/11/11. Link da publicação:
http://m.correio10.com.br/noticia/9830/reitor-ve-indicios-de-fraude-no-hulw