23 de fevereiro de 2011

Fasciite Necrotizante: Aspectos Clínico-Epidemiológicos

Fig. 1

Fig. 2

Fig. 3
Por Bruno Melo Fernandes Estudante de Graduação em Medicina da UFPB
Resumo

Entidade rara, mas de extrema gravidade, a fasciite necrotizante é um processo infeccioso/inflamatório do tecido celular subcutâneo e pele adjacente, que pode levar rapidamente a perda de segmentos importantes do tegumento. Em geral, ocorre após pequenos traumas locais e é importante o seu pronto reconhecimento clínico, visando a um tratamento rápido para que sejam evitadas lesões extensas.

Palavras-chave: Infecção. Fasciite Necrosante. Celulite. A fasciite necrotizante (FN) é uma afecção rara, mas de gravidade significativa que afeta, a princípio, o tecido celular subcutâneo profundo e a fáscia a ele associada. Nesses locais ocorre o início de um processo infeccioso e inflamatório agudo, de caráter necrotizante e rapidamente progressivo, cuja principal característica é a presença de extensa necrose do tecido celular subcutâneo associada a uma relativa preservação do músculo subjacente. É caracterizada por necrose ampla do tecido celular subcutâneo e fáscias, que avança rapidamente em extensão superficial. Os sintomas e sinais clínicos característicos da FN geralmente começam no sétimo dia após o início do processo infeccioso.
Os primeiros sinais são o surgimento de área de celulite eritematosa, com grande intumescimento local e calor local, geralmente precedida por dor muito intensa na área afetada e acompanhada de toxemia sistêmica. Deve-se suspeitar do diagnóstico sempre suspeitado que existe desproporção entre a dor e os achados clínicos em pacientes toxêmicos. Pode ocorrer febre entre 38 e 40 graus Celsius. Com a evolução o eritema se espalha difusamente, tornando difícil distinguir com nitidez a transição entre a pele íntegra e a acometida pelo processo inflamatório. Em pouco tempo, a coloração da região cutânea acometida se torna azul-escuro ou acinzentado, com formação de bolhas contendo fluido seroso, tornando-se em seguida hemorrágica e de coloração roxa. Secundariamente ao processo infeccioso nos sítios primários de inflamação, são acometidos os tecidos mais superficiais e a pele em decorrência da lesão vascular, trombose e isquemia, resultantes da ação das citocinas pró-inflamatórias, proteinases e endotelinas. A destruição de nervos subcutâneos ocorre em fases mais avançadas. Após um traumatismo, em geral inicia-se, em 12 a 72 horas, dor intensa no local traumatizado associada hiperemia, hipertermia e edema locais. Em geral a dor é desproporcionalmente maior que os achados inflamatórios locais, o que também sugere a profundidade da infecção.
Com a evolução do quadro, há progressivo aumento da área inflamada, com aparecimento de sintomas gerais como febre e calafrios. A continuação do processo inflamatório também cursa com o surgimento de lesões vesiculares e áreas de necrose nos locais acometidos. A FN pode atingir qualquer parte do corpo, porém é mais comum na parede abdominal, extremidades e períneo. Não existem dados precisos quanto a sua real incidência, especialmente no Brasil. Nos Estados Unidos, segundo o Centers for Disease Control (CDC), são estimados entre 500 a 1500 casos de fasciite necrotizante anualmente. Ainda segundo o CDC, a mortalidade relatada varia de 13% a 76%, sendo influenciada pela precocidade do diagnóstico, abordagem cirúrgica e doenças associadas. A FN ocorre, em geral, em indivíduos de ambos os sexos na quinta e sexta décadas de vida. Na maior parte dos casos, a extensão da lesão ocorre a partir de pequenos traumas, picadas de insetos ou incisões cirúrgicas. Contudo, em 20% das situações, nenhum trauma prévio pode ser identificado.
A fasciite necrotizante pode ser classificada em FN tipo I, que tem flora polimicrobiana representada por bactérias anaeróbias, anaeróbias facultativas e enterobactérias, e tipo II, monomicrobiana e causada pelo Streptococcus pyogenes ou, mais raramente, pelo Staphylococcus sp. Em geral, o paciente acometido é previamente hígido, porém algumas condições predispõem à fasciite necrotizante, como o diabetes mellitus, a corticoterapia, o alcoolismo, o uso de drogas injetáveis e a presença de queimaduras. O termo fascite necrosante foi primeiramente utilizado por Wilson, em 1952. Hoje esta doença é conhecida pelos leigos como "doença da bactéria comedora de carne" e de "gangrena galopante". O diagnóstico dessa afecção é eminentemente clínico, configurando um quadro de celulite rapidamente progressiva que evolui com necrose intensa.
A confirmação, em geral, é realizada pelos achados cirúrgicos, que revelam pouca aderência do tecido subcutâneo, observada à manipulação cirúrgica, ausência de sangramento e liquefação da gordura subcutânea. O estudo ultra-sonográfico de partes moles, quando realizado, pode denotar edema intenso adjacente à fáscia, com ou sem coleções ou hiperrefringência.
A tomografia computadorizada e, especialmente, a ressonância nuclear magnética, são os métodos de escolha em casos duvidosos, apesar de caracteristicamente não alterarem a conduta a ser tomada, o que torna a sua requisição questionável. Além disso, os exames de imagem são falhos em detectar as fases mais precoces da fasciite necrotizante. É importante o pronto reconhecimento clínico desse quadro, visando a um tratamento rápido para que sejam evitadas lesões extensas. Referências COSTA, I. M. C. et al . Fasciíte necrosante: revisão com enfoque nos aspectos dermatológicos. An. Bras. Dermatol. 79 (2): 211-224, 2004. MILLER, A. T. et al. Postprocedural necrotizing fasciitis: a 10-year retrospective Review. Am Surg. 74 (5): 405-9, 2008. NETO, G. P. B. Fasciíte necrotizante. In: Tavares W, Marinho LAC. Rotinas de diagnóstico e tratamento das doenças infecciosas e parasitárias. São Paulo: Atheneu, 2005, p. 421-6. SOARES, T. H. et al. Diagnóstico e tratamento da Fasciíte Necrosante (FN): relato de dois casos. Rev. Med. de Minas Gerais, 18 (2): 136-140, 2008.
SPROVIERI, S. R. S. et al. Fascite Necrosante. Rev Bras Med. 2011. Disponível em: http://www.cibersaude.com.br/revistas.asp?fase=r003&id_materia=103. Acesso em: 23 fev. 2011. Figuras Figura 1: Lesão antes do tratamento cirúrgico. Disponível em: http://www.allhealth.com.au/ Figura 2: Lesão antes do tratamento. Disponível em: www.jyi.org Figura 3: Lesão após tratamento cirúrgico. Disponível em: http://www.antimicrobe.org/